Resumo de História do Brasil – O Segundo Reinado

História do Brasil – SEGUNDO REINADO.

Política Interna e Externa

Prof. Brasil Bandecchi, 1970

"É nesse ambiente conturbado que D. Pedro sobe os degraus do trono.

E logo, como que tocada por alguma vara de condão, a política do Império começa a se aplacar.

É verdade que ainda restava a liquidação das guerras dos Balaios e dos Farrapos. Mas a primeira estava nos últimos arrancos e a segunda mostrava, inequivocamente, o declínio das forças rebeldes.

Além destas duas heranças da época regencial, D. Pedro II, no decênio de consolidação da ordem, de 1840 a 1850, tem que haver-se apenas com dois movimentos sérios: a Revolução Liberal mineiro-paulista de 1842 e a Revolução Praieira, de 1848, em Pernambuco.

Foram ambos movimentos deflagrados pelos liberais, sendo o de 42, de caráter exclusivamente político, enquanto o de 48, em virtude de circunstâncias especiais da economia pernambucana, tomava matiz de uma luta social. Nabuco, com a habitual largueza de vistas, já tinha chamado à insurreição da Praia mais que um movimento político, um movimento social. Mas a presença do Imperador no trono já se fazia sentir."1

Deste momento, começa a política a tomar rumo mais seguro e o Parlamento torna-se a arena dos debates e competições. A figura de Caxias aparece e se transforma no baluarte da defesa da ordem que se imporia durante um largo período do Segundo Reinado.

O Segundo Reinado durou quase meio século e pode ser dividido em três períodos: de 1840 até 1850, fim das lutas civis; o segundo, o das lutas externas, em que a de maior duração e de maiores conseqüências foi a Guerra do Paraguai; e o terceiro, finalmente, a partir da Guerra do Paraguai, quando as idéias abolicionista e republicanas começam a tomar corpo e, por fim, tornam-se vencedoras em 1888 e 1889, respectivamente.

No primeiro período, Caxias foi a espada que cortou a trama das guerras civis e dos movimentos armados, o qual, aliás, vinha prestando serviços à Pátria desde a Regência e, lutou, ainda, no Paraguai, no momento decisivo desse conflito.

Na política externa teve o Brasil, também, o rompimento diplomático com a Inglaterra, em 1862, devido à famosa Questão Christie, motivada pelo alegado assalto a um barco inglês, no Rio Grande do Sul, em 1861, sendo que nessa ocasião o ministro inglês no Rio (Christie) exigiu uma indenização. No ano seguinte, alguns oficiais ingleses, à paisana, estando embriagados, desacataram uma sentinela brasileira, na Tijuca, sendo, por esse motivo, e com a mais justa razão, presos por um alferes. Christie, atrevidamente, exigiu que o alferes que havia cumprido o seu dever fosse excluído do corpo de que fazia parte. Não tendo o governo brasileiro atendido ao ministro inglês, Christie determinou que o vice-almirante Warren, que se encontrava na Guanabara, apreendesse embarcações mercantes nacionais, o que foi feito sob o mais veemente protesto do povo e até censurado no próprio Parlamento Britânico.

Christie recebeu passaporte para deixar o Brasil. Quanto à indenização reclamada pelo alegado saque em águas do Rio Grande do Sul, o Brasil preferiu encerrar o caso, pagando a quantia de £ 3 200. A prisão dos oficiais ingleses na Tijuca foi submetida ao rei Leopoldo I, da Bélgica, que, em 1863, deu ganho de causa ao Brasil. Em 1865 reatamos relações com a Inglaterra.

Conselho de Estado

Dentre as medidas administrativas importantes, encontra-se em 1841, a restauração do Conselho de Estado, criado por D. Pedro I, quando dissolveu a Assembléia Constituinte, e que havia sido suprimido pelo Ato Adicional de 1834. Este conselho, formado por doze membros ordinários e doze extraordinários, existiu até a proclamação da República. Tinha "amplo

objetivo, que atingia à boa execução das leis, decretos, regulamentos e até propostas do monarca à Assembléia Geral. E digno de nota que, consoante bem ponderou Tavares Lira (Duas Memórias, pág. 123) nosso direito administrativo e financeiro se formou menos por atos do poder legislativo do que por decretos do executivo. E é lícito assegurar que para isso muito concorreu o Conselho de Estado."2

Código Comercial e Lei das Terras Devolutas

Em 1850 foi sancionado o Código Comercial Brasileiro.

No período colonial, o comércio brasileiro era regido pelas Ordenações do Reino, alvarás, decretos e ordens régias, muitos destes proibindo até a fabricação de produtos que viessem a fazer concorrência aos de Portugal o que, evidentemente, influía no comércio.

Desde 1809, cuidavam os brasileiros de elaborar o seu Código Comercial, tendo a Junta de Comércio do Rio de Janeiro encarregado dessa tarefa o Visconde de Cairu, o qual não a levou avante. Só em 1832, na Regência, tratou-se com firmeza do assunto, nomeando-se para escrever o código a seguinte comissão: Antônio Paulino Limpo de Abreu, José Antônio Lisboa, Guilherme Nidosi, Inácio Ratton e Lourenço Westin, este em lugar de Honório José Teixeira que não aceitou o encargo.

No ano seguinte, Limpo de Abreu, eleito presidente da Câmara dos Deputados, foi substituído por José Clemente Pereira, que, como o primeiro, presidiu a comissão.

Terminado o projeto que recebera a benéfica influência dos códigos mais adiantados da época e de escritores consagrados, em 1834, é enviado à Câmara dos Deputados e ao Senado. Examinado por uma comissão mista formada por deputados e senadores, emendado, discutido, andou pelas casas legislativas nada menos de 16 anos, pois que só em 1850 recebeu redação final e tornou-se a Lei n9 556 de junho daquele ano.

Nesse mesmo ano de 1850, tivemos o memorável Regulamento 737 de 25 de novembro, verdadeiro Código de Processo Comercial, que, pela sua perfeição, veio a ser, por força do Decreto 763 de 19 de setembro de 1890, aplicado também às causas cíveis.

Outra lei importante de 1850 é a Lei 601, sobre as terras devolutas, pondo fim ao regime jurídico da posse. "A ocupação de terras devolutas, foi, então, inequivocamente proibida, e o dano produzido pela derrubada de matos e queimadas, qualificado como crime punível com multa de cem mil-réis e a pena de dois a seis meses de prisão."3

Proteção às Letras, Artes e Ciências

Ê de se ressaltar, ainda, que D. Pedro II protegeu sobremaneira as artes, as letras e as ciências e procurou expandir o ensino. E que serenados os ânimos nas lutas intestinas e resolvidos problemas de ordem internacional, deu ao Brasil um período de paz e prosperidade.

Tinha a vaidade, se é que a isto se pode chamar de vaidade, de privar com os espíritos mais adiantados do século, como, por exemplo, Victor Hugo.

Possuía suas esquisitices. È evidente que não sâo poucas as críticas que se pode fazer ao seu governo, mas é preciso levar-se em conta que reinou durante 49 anos.

Organização Econômica

A economia do Brasil Império, evidentemente, seria uma continuação da Colônia e do Brasil Reino, com novas perspectivas que se abriam para uma nação independente, sem restrições de alvarás e cartas régias que proibiam certas atividades, porém sem saltos, dentro de uma evolução natural.

O Café

Na agricultura, além dos produtos já referidos, tivemos â cultura do café, que embora aqui chegado em 1727, somente no Império teve o grande impulso que o tornou o esteio da economia nacional.

Afonso de Taunay escreve:

"Tem-se como incontestável que a Francisco de Melo Palheta, brasileiro, natural do Pará, oficial do exército português colonial do Brasil, onde atingiu o posto de sargento-mor, e que equivaleria hoje a major, se deveu a transplantação do cafeeiro às terras brasileiras. Era homem do mais real valor. Sua biografia como a de muitos de seus contemporâneos do Brasil colonial, encerra numerosas obscuridades e lacunas a que talvez remova melhor exploração dos arquivos."

Tão importante é a introdução do café no Brasil que quando se fala em Palheta não se pensa em outra coisa.

Trouxe para o Brasil cinco mudas de café e "mais de mil grãos capazes de germinar, como mais tarde informaria a D. João V, em 1733, ao alegar serviços prestados à Coroa."

Por aí se vê que apenas sete anos depois da introdução do café no Brasil êle já deveria representar alguma coisa, pois, caso contrário, não seria serviço digno de ser mencionado.

Até 1760, o café ficou pelo Norte. Nesse ano, porém, é trazido para o Rio de Janeiro pelo desembargador João Alberto Castelo Branco, que fora transferido do Pará para aquela cidade.

"Deu-se, segundo parece, em 1760, a chegada das mudas do Chanceler Castelo Branco ao Rio de Janeiro.

Pretendem alguns autores que o primeiro cultivador da rubiácea em terras fluminentes foi o holandês João Hoppmann, dono de grande chácara em Mata-Porcos, então nos subúrbios do Rio.

Dizem outros que esses pioneiros da cafeicultura foram os capuchinhos italianos, ou Barbonos, em sua chácara, hoje desaparecida, pois corresponde a uma parte do coração da cidade.

O ilustre botânico Freire Alemão perfilha esta versão. Documentou-a, contando que a plantação dos capuchinhos foi de 1762 e a de Hoppmann de 1770 e realizada a instâncias do vice-rei marquês do Lavradio."4

Eis, enfim, o café no Rio de Janeiro. Aqui começa a etapa decisiva de sua gloriosa vida.

Chegou-se a afirmar, e com razão, que o café era o Brasil.

Vê-lo-emos, em seguida, alastrando-se pelo Rio, penetrando o fecundo Vale do Paraíba, espalhando-se por São Paulo, enriquecendo o Brasil.

Em 1820, o Rio de Janeiro exportou 97 500 sacas de café e dez anos depois, sendo o Brasil independente há oito, o dito porto exportava 391 785 sacas.

Dos municípios produtores de café, então, o mais destacado era Vassouras. Depois vinham Cantagalo, Valença, Paraíba do Sul etc. O café se transformou em notável fonte de riqueza. Pelos números é fácil de se evidenciar a assertiva. Em 1820 o Rio de Janeiro exportava 97 500 sacas, em 1850 a produção subiu a 1 343 484, e dez anos mais tarde, ou seja em 1860, atingia 2 127 219, num crescente, até que veio a ceder o cetro a São Paulo, cujo cultivo demorou um pouco, devido à falta de bom transporte e de braços.

Do Rio, o café iniciou sua marcha pelas províncias de São Paulo, Minas e Espírito Santo.

O Vale do Paraíba se apresentava como estrada natural para a evolução do exército verde dos cafezais.

No período que vai de 1830 a 1860, as lavouras açucareiras, em São Paulo, começaram a ser substituídas pelo café, ou melhor, o café passou a ser mais cultivado do que a cana-de-açúcar.

"A principal lavoura era a de cana-de-açúcar, iniciada em 1532, quando começou a colonização do território paulista. O centro da cultura açucareira ficava em Itú, então metrópole agrícola da terra dos bandeirantes: em 1819 contava esse município

mais de 100 engenhos, produzindo cerca de 100 000 arrobas de açúcar. Campinas, que principiava a prosperar com rapidez, neste mesmo ano já possuía 60 engenhos de açúcar, sendo 15 movidos a água, e cerca de 40 de aguardente: sua produção anual excedia de 100 000 arrobas. Toda a região açucareira, compreendendo Campinas, Itú, Piracicaba, Porto Feliz, Sorocaba e Jundiaí, até Mogi-Mirim, exportava aproximadamente 300 000 arrobas de açúcar, cujo preço regulava de 1S000 a 1S200 a arroba do branco. (…) Cinco anos após a Independência, em 1827, uma estatística indicava 570 engenhos da província, produzindo 795 365 arrobas de açúcar e 247 939 barris de aguardente. A produção do café naquela data, não devia exceder de 360 000 arrobas, pois Taubaté não produzia mais de 10 846 arrobas em 1830. (…) Depois de 1835, a cultura começou a derivar-se para o chamado Oeste, onde vai estender-se rapidamente, favorecida pela terra roxa e pelo clima adequado. Ainda em 1835-36 o município de Campinas, nessa fertilíssima região, produzia apenas 808 arrobas de café. Mas dentro em pouco os fazendeiros, seduzidos pelos lucros da lavoura cafeeira, a ela se dedicaram de preferência, abandonando a cana. De tal arte, em 1850 a produção do referido município constava de 200 000 arrobas de café 160 000 de açúcar."5

Em 1854, o café já suplantava a cana-de-açúcar. Assim é que, para 2 618 fazendas daquele havia 667 desta, e o valor da produção do primeiro era de 10 461 173$000, enquanto a da segunda era de 1 630 050S000 (açúcar e aguardente).

Na segunda metade do século passado, as vias férreas dariam à rubiácea enorme expansão que, em breve, o Rio de Janeiro passaria para segundo plano e os paulistas dominariam, de modo absoluto, o mais notável setor agrícola do Brasil em todos os tempos. Em 1870 sua produção somava 3 342 251 arrobas. O açúcar caiu tanto que, quase inacreditável, São Paulo passou a importá-lo de outros Estados.

"Quase no fim do regime imperial, em 1884-85, quando a corrente imigratória principiou a tornar-se importante, a produção agrícola discriminava-se assim: café, 9 779 151 arrobas; açúcar, 448 545 arrobas; aguardente, 160 000 hectolitros; algodão, 1 365 551 arrobas; fumo, 133 000 arrobas; vinho, 12 600 hectolitros; e quantidades não conhecidas de milho, feijão, arroz, batata etc."0

Dito isto sobre a produção do café em São Paulo e feitas as comparações com outros produtos vejamos agora, a exportação do produto durante o Império:

Quantidade de café exportado pelo Brasil em milhares de

sacas:

1821-1830 …………………. 3 178

1831-1840 …………………. 9 744

1841-1850 …………………. 17 121

1851-1860 …………………. 26 253

1861-1870 …………………. 28 847

1871-1880 …………………. 36 336

1881-1890 …………………. 53 326

É de se assinalar que de 1871 em diante, o Brasil exportou sobre o conjunto mundial, 56,6% no decênio 1871-1880, e 61,5% no 1881-1890.

Indústria

A indústria propriamente dita, só começou a desenvolver-se na segunda metade do século XIX.

No princípio daquela centúria houve iniciativas governamentais de organizar-se empresas metalúrgicas em São Paulo e Minas, tendo D. João contratado técnicos alemães (Varnhagen, pai do historiador, e Eschwege) para organizarem essa importante iniciativa. Mas o fato é que o Brasil, como Portugal, preso à Inglaterra por tratados de comércio, somente mais tarde teria condições de desenvolver-se industrialmente.

O Tratado de 1810 era uma herança pesada e desinteressante.

Dos tempos coloniais vinham-nos proibições como a de fabricar sabão (Alvará de 5 de fevereiro de 1767), a de haver manufaturas no Brasil (Aviso Régio de 5 de janeiro de 1785) e a que impedia que os governadores recebessem em audiência pessoas cujas roupas não fossem feitas de pano importado de Portugal (Ordem Régia de 5 de junho de 1802), etc.

De 1850 em diante as coisas vão tomando outro sentido. A tranqüilidade que ia se implantando à medida que o Imperador crescia em idade e em poder, a presença de um homem forte como Caxias, e, logo mais, o aparecimento de um vulto empreendedor e progressista como Mauá, capaz de entender o sentido social da riqueza e de promover iniciativas beneficiadoras do bem público e do povo, as rupturas, embora lentas, dos liames que

nos prendiam à Grã-Bretanha, tudo isso ensejaria ao Brasil um passo firme na rota do progresso.

Ação de Mauá

Mauá encarna um momento decisivo da nossa história econômica.

"No seu tempo, soprou um vento renovador em nossa economia. Caio Prado Júnior assinala que no decênio posterior a 1850 fundaram-se 62 empresas industriais, 14 bancos, 3 caixas econômicas, 20 companhias de navegação a vapor, 23 de seguros e de colonização, 8 de mineração, 3 de transporte urbano, 2 de gás e finalmente 8 estradas de ferro. Calógeras menciona que, de 1839 a 1874, o número de viagens aumentou de 50% sob a bandeira brasileira e de 101% sob o pavilhão de outras nações, a tonelagem cresceu de 130% no primeiro caso e de 414% no segundo. Em 1859, quase todos os barcos eram veleiros, enquanto que em 1873 já possuíamos 29 % movidos a vapor. Dez anos após a inauguração da primeira estrada de ferro, isto é, em 1864, a extensão trafegada atingiu a 475 quilômetros, a 1 801 em 1875 e a 9 583 em 1889. De 55 740 contos nas importações e 52 449 contos nas exportações, em 1846-47, passamos para 76 918 contos nas entradas e 67 788 contos nas remessas para o exterior, cinco anos depois, ou seja, em 1850-51. Ao findar a década, em 1860, tínhamos um acréscimo de 150% em doze anos, com equilíbrio em nosso comércio exterior e daí por diante as exportações excedendo às importações. (…) Esse impulso admirável de nossa vida econômica era, boa parte, obra de Mauá, reflexo de sua ação, mas que ao mesmo tempo atuava sobre êle, impelindo-o para a frente, juntamente com outros, de atuação destacada na época. O comércio renovou-se e ampliou-se; nasceram indústrias; novos meios de transporte e comunicação apareceram, dando lugar a uma expansão considerável da riqueza nacional."7

O visconde de Mauá (Irineu Evangelista de Sousa) após ter sido um dos propulsores do progresso do Brasil, teve que enfrentar momentos dos mais difíceis, quando da falência de Mauá & Cia. E não querendo deixar sem uma explicação do desastre que tão duramente o atingia, publicou, cm 1878, um longo trabalho, que é a história de sua vida, cheia de lutas, realizações e tormentas. Este trabalho intitula-se Exposição do Visconde de Mauá aos Credores de Mauá & Cia. e ao Público.

 

Barão de Mauá.

Extensão das estradas de ferro no Império:

1854 …………………… 14 quilômetros

1864 ………………….. 475

1875 …………………… 1.801

1889 …………………… 9.583

No período Republicano, não incluindo as linhas suprimidas, foram construídos 22.471 quilômetros de estradas de ferro, chegando, assim, em 1968, a somar 32.054 quilômetros.

A Primeira locomotiva do Brasil e da América Latina. Chamava-se "Baronesa" em homenagem à esposa do grande empreendedor que -foi o

"Na idade avançada em que me acho — escreve Mauá — em presença do acontecimento que motiva esta exposição, realizada pelo modo por que me foi resolvido, não posso ter outro objeto em vista senão salvar do naufrágio aquilo que para mim vale mais do que quanto ouro tem sido extraído das minas da Califórnia — um nome puro, pois persisto em acreditar que o infortúnio não é um crime.

Entre as empresas que criei e as que tiveram existência devida aos meus esforços e auxílios que lhes prestei — bem como alguns serviços de vulto, quer pessoais, quer os que se basearam no meu crédito pessoal, e ulteriormente nos recursos da Casa Mauá durante o segundo período da minha vida financeira, que começou há 32 anos, nem todos foram acompanhados de resultado favorável (…)"

E numera, lembrando-se, sem outra fonte que a própria memória, as seguintes realizações:

Estabelecimento da ponta da areia; Companhia de Rebocadores para a barra do Rio Grande; Companhia de Iluminação a gás do Rio de Janeiro; Serviços prestados à política do governo imperial no Rio da Prata, a pedido dos ministros; Companhia Fluminense de Transportes; Banco do Brasil (anterior ao atual); Companhia de Estrada de Ferro de Petrópolis (vulgo Mauá); Companhia Navegação a Vapor do Amazonas; Serviços prestados à realização da Estrada de Ferro da Bahia; Companhia Diques Flutuantes; Companhia de Cortumes; Companhia de Luz Esteárica; Montes Áureos gold mining Company; Estrada de Ferro Santos a Jundiaí; Serviços prestados à Estrada de Ferro D. Pedro II; Serviços prestados ao caminho de ferro da Tijuca; Botanical Garden’s Rail Road Co.; Exploração da Estrada de Ferro do Paraná ao Mato Grosso; Cabo Submarino; Abastecimento de água à Capital do Império; Estrada de Ferro do Rio Verde; Banco Mauá & Cia.; e Serviços prestados à agricultura.

Declara que essa lista está incompleta e que nela não estão contemplados "serviços diretos prestados aos esforços de outros no sentido de levarem avante melhoramentos materiais do país", em que êle Mauá não apareceu, serviços esses cuja relação seria longa.

A Agricultura c o Elemento Servil

Iniciada a colonização do Brasil, os conquistadores da terra tiveram que lançar mão do índio, prendendo-o, dominando-o

para, como escravo, submetê-lo aos seus trabalhos, principalmente agrícolas.

Mas o índio não provou bem tais trabalhos e nem se sujeitou à condição que lhe era imposta, com docilidade ou mesmo acomodação. Já em Portugal, desde 1442, havia comércio de negros levados da África para servirem como escravos. Em 1444, aquele comércio que dois anos antes fora insignificante, surge como bem maior expressão, pois que no Algarve eram desembarcados e vendidos mais ou menos 250 africanos.

"Desde logo começaram os horrores para apreensão dos escravos, na África, e foi necessário que o governo tomasse providências para que o comércio se fizesse mais humanamente.

O certo é que já então eram anualmente importados em Portugal 700 a 800 escravos. Portugal e Espanha viram os seus mercados inundados de africanos; Sevilha sobretudo, e Lisboa eram verdadeiras alfândegas desse abominável e negro tráfego; devendo todos dar entrada em Lisboa (quanto a Portugal) a fim de pagarem o imposto. Por forma que logo desde 1539 a Capital do Reino apresentava no mercado anualmente 10 a 12 000 escravos."8

A caça ao homem africano era, portanto, quando o Brasil passou a ser povoado, uma prática de mais de 50 anos, levada a efeito por portugueses e espanhóis. Daí o emprego do braço negro, predominantemente na agricultura brasileira pelos colonizadores lusos.

O negro veio para o Brasil com o desenvolvimento da cultura da cana-de-açúcar e dos engenhos, e desejando a "Metrópole promover essa indústria, facultou por Alvará de 29 de março de 1549 (D. João 111) o resgate à custa dos colonos senhores de engenho, a introdução de escravos africanos de Guiné e Ilha de São Tomé, em número de 120 a cada senhor de engenho montado e em estado de funcionar, mediante o favor da redução dos direitos."9

A contribuição do negro na economia pátria seria das mais notáveis, como o foi também nos costumes, culinária etc.

"O desenvolvimento das nossas correntes imigratórias cessou-se, como de sobra é sabido, muito lentamente. Portugal, país de pequena densidade territorial, pouco podia povoar sua imensa Colônia sul-americana. Sua população, no século XVI, quando muito atingia uns quinze habitantes por quilômetro quadrado.

Daí, a imperiosidade de se recorrer a tráfico escravo, para os reclamos de sua agricultura. Daí, a imposição que incorporou os milhões de africanos trazidos pelas navegações.

As tentativas de colonização branca foram quase nulas, como ninguém ignora. Duas houve mais sérias, como as que levaram à Santa Catarina e ao Rio Grande do Sul, alguns milhares de açorianos e madeirenses. Ou a que encaminhou para a Amazônia Setentrional os refugiados de Mazagão, rccém-recupe-rada pelos marroquinos. Da vinda de D. João VI, em 1808, para seu vice-reino americano, e, em 1815, reino ultramarino, provocaria a atenção dos dirigentes da monarquia para a necessidade do povoamento por colonos brancos.

Não podia Portugal, sempre despovoado, fornecer senão muito escassos elementos, sobretudo depois da terrível provação por que- passou com as guerras napoleónicas.

Poucos ensaios ocorreram, portanto, utilizando reinóis. Cita-se, por exemplo, o caso de Casa Branca, em São Paulo, onde os colonos atirados irracionalmente, a verdadeiro ermo, não poderiam de todo prosperar, como era de esperar e de fato aconteceu. E, aliás, no Brasil o português se adaptou sempre mal às exigências da lavoura, como trabalhador do campo. A escravidão o afastava das culturas."10

E, assim, o escravo africano tornou-se o braço da nossa lavoura durante todo o regime colonial e grande parte do imperial, quase que exclusivamente.

Para honra nossa, sempre houve brasileiros que protestaram contra a escravidão e tomaram posição decisiva para libertar os escravos, uns desejando a abolição pura e simples e outros paulatinamente, dadas as condições da economia brasileira depender do braço escravo.

José Bonofácio escreveu um trabalho que devia ser apresentado à Assembléia Constituinte, e cuja exposição de motivos situava o problema sob diversos e importantes aspectos.

Em 1831, Feijó, quando ministro da Justiça, promulgou uma Lei cujo artigo Io estatuía:

"Todos os escravos que entrarem no território ou portos do Brasil vindos de fora, ficam livres."

"Como se sabe — escreve Nabuco — essa lei nunca foi posta em execução, porque o governo brasileiro não podia lutai com os traficantes; mas nem por isso deixa ela de ser a carta de liberdade de todos os importados depois da sua data."

Em 28 de setembro de 1871, foi promulgada a Lei do Ventre Livre (n? 2 040), sendo o visconde do Rio Branco, presidente do Conselho de Ministros, e em 1885, a Lei n9 3 270, que libertava todos os escravos maiores de 60 anos. Presidia o Conselho, José Antônio Saraiva.

Por aí se vê que após a Guerra do Paraguai o caso dos escravos vai tomando caminho mais seguro, da mesma forma que as idéias republicanas encontravam terreno mais propício.

Por fim tivemos, quando Regente a princesa Isabel, a Lei nç 3 353, de 13 de maio de 1888, sendo ministro da Agricultura Rodrigo Araújo da Silva.

A libertação dos escravos, contrariando interesses dos grandes fazendeiros, notadamente do Nordeste, seria golpe final na estrutura monárquica que de há muito sentia seus alicerces abalados.

NOTAS

1 Afonso Arinos de Melo Franco, A Maioridade ou a Aurora do Segundo Reinado, edição do Departamento de Estudos Brasileiros do Centro Acadêmico XI de Agosto da Faculdade de Direito da U.S.P. organizada e revista por Brasil Bandecchi, São Paulo, 1940.

2 Basílio de Magalhães, História Econômica e Administrativa do Brasil, Rio de Janeiro, 1951.

3 Rui Cirne Lima, Terras Devolutas, Porto Alegre, 1935.

4 Afonso de E. Taunay, A Propagação da Cultura Cafeeira, Rio de Janeiro, 1934.

5 Paulo R. Pestana, A Expansão Econômica do Estado de São Paulo num Século (1822-1922), São Paulo, 1923.

6 Paulo R. Pestana, ob. cit.

7 Heitor Ferreira Lima, Mauá e Roberto Simonsen, São Paulo, 1963. História Político, Econômica e Industrial do Brasil, São Paulo, 1970.

8 Perdigão Malheiro, A Escravidão no Brasil, São Paulo, 1944.

9 Idem.

10 Afonso de E. Taunay, Pequena História do Café no Brasil, Rio de Janeiro, 1945.


Fonte: Material Didático Didática irradiante de 1970 de acordo com diretrizes da época do MEC

 

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