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Os Jesuítas e o jansenismo

Segundo Saint-Simon, Luís XIV foi apenas chorado pelos serviçais e pelos jesuítas. A estes ele protegera muito nas suas disputas com os jansenistas, assim chamados por professarem a doutrina de um bispo holandês de Ipres, a qual exagerava o princípio da graça, envolvendo deduções para a moral cristã de novos motivos de austeridade e para a vida de práticas rigorosas em reação contra uma religião fácil e frívola na sua ostentação. O jansenismo aproximava-se assim sem o querer do calvinismo: alguém o considerou com acerto o equivalente com relação aos católicos, dos puritanos com relação aos anglicanos. A perseguição religiosa sofrida pelos seus sectários feriu mais de 30 000 pessoas.

Pascal. Pregadores clássicos e moralistas

Contra os jesuítas, representantes do ultramontanismo ou supremacia da Santa Sé, foram escritas as Provinciais de Pascal (1623-1662), o matemático e físico que se desdobrou num admirável psicólogo. A corte de Luís XIV ouviu os pregadores que maior realce têm dado à tribuna sagrada: Bossuet (1627-1704), Fléchier (1632-1710), Bourda-loue (1632-1704), Massillon (1663-1742). Eles emprestaram as pompas da sua eloqüência à glorificação dos triunfos e à suavização das dores. O século foi o da perfeição clássica estampada nas tragédias de Corneille (1606-1684), de um sopro heróico, e nas de Racine (1639-1699), de uma linguagem harmoniosa. Não houve exaltação alguma na produção literária, conquanto por vezes enfática e quase sempre aduladora. Boileau (1636-1711) regulou a poética, podou a retórica, educou a sátira. Lafontaine (1621-1675) compôs contos licenciosos, mas sobretudo fábulas graciosas e sugestivas. La Bruyère (1645-1696) desenhou caracteres com uma pena acerada e La Rochefoucauld (1613-1690) formulou como moralista máximas educadoras do espírito. Molière (1622-1673) flagelou nas suas comédias os ridículos mais do que os vícios.

O espírito francêsA pintura francesa

A Academia Francesa, fundada pelo cardeal de Richelieu em 1634, constituíra-se a guarda da linguagem e da forma, assim como a Real Sociedade de Londres, estabelecida em 1660, comprovou o feitio mais prático da inteligência inglesa no cultivo das ciências naturais, das matemáticas e dos conhecimentos úteis. Ciência, literatura e arte, tudo se oficializava. A sociedade francesa era talvez a mais culta, embora amaneirada, a mais refinada, embora intolerante. Dizem os franceses que o espírito da sua nacionalidade irradiou então por todo o mundo, o que é, de certo ponto de vista, inexato porque a cultura francesa é grandemente devedora à italiana e à espanhola, que ambas possuíam nos seus gênios respectivos maior envergadura e maior pujança, sendo que o caráter espanhol primava pelos seus predicados de nobreza e lealdade. O gênio francês, com a sua medida, o que fêz foi temperar o gosto com a sobriedade e emprestar o sal do espírito aos ouropéis cortesãos. A sua pintura não se destaca, nem pela originalidade, nem pela concepção: distingue-se com Cláudio Loreno (1600-1682) pela sedução das suas paisagens de pôr do sol, com Poussin (1594-1665) pelas suas alegorias clássicas e com Lebrun (1619-1690) pelas suas composições teatrais, de um rico colorido certamente bebido na escola veneziana do século anterior, famosa pelos pincéis do Ticiano (1477-1576), do Veroneso (1528-1588) e do Tintoreto (1512-1594).

A situação da Rússia no fim do século XVI

A Rússia permaneceu até o século XVII fora do convívio europeu, potência semi-asiática, semibárbara, conforme foi definida, tendo a separá-la da civilização ocidental uma grande extensão de Estados que interceptavam qualquer comunicação e assim continuavam a obra isoladora das invasões mongólicas. Eram esses Estados a Suécia, formando com a Finlândia, a Estônia e a Livônia uma das grandes potências do continente; a Polônia, Curlândia e Lituânia juntas, formando outra grande potência, e ao sul o considerável império turco que abrangia todo o litoral do Mar Negro, a Bessarábia e a Moldávia. Onde não havia raças hostis e dominadoras, eram bandos sem cultura que ficavam de permeio, distanciando o núcleo de agregação constituído por Moscou, cujos príncipes ou czares tinham do século XV em diante entrado a expelir os tártaros e a incorporar territórios.

Pedro Magno e sua obra

A população russa ou que veio a sê-lo encerrava elementos guerreiros como as tribos cossacas, mas pela maior parte era agrícola, muita dela cultivando a terra na servidão, adstrita à gleba como fora o caso no ocidente feudal. Da sua situação obscura logrou o país sair pelo esforço de um super-homem que foi Pedro Magno, o qual subiu ao trono em 1682 e pertencia à dinastia dos Romanoff, fundada em 1613 após a extinção da dinastia escandinava e uma fase de anarquia. Este monarca, na típica expressão de um escritor americano, meteu os russos dentro da civilização a knut (chicote). A Rússia teve que envergar à força a vestimenta ocidental, quando mesmo lhe fosse impossível digerir todas as idéias ocidentais. Pedro Magno encarregou-se porém de pensar por ela.

Compreendendo que a necessidade capital da Rússia consistia em saídas para o mar, pois que os gelos fechavam longos meses a única que ela possuía e que era Archangelsk no Mar Branco, o grande soberano concebeu o gigantesco desígnio de tomar aos suecos a costa do Báltico e aos otomanos o antigo Ponto Euxino. Descendo o Don, apoderou-se de Azof em 1696; mandou mancebos nobres aprenderem sobretudo construção naval no Ocidente e empreendeu êle próprio uma longa viagem de estudos, durante a qual diz Voltaire que trabalhou como artífice nos estaleiros da Holanda, a potência marítima por excelência do tempo; suprimiu de regresso a sua terra uma revolta dos turbulentos milicianos que êle organizara em guarda pretoriana — os streltsi —, ajudando na faina da decapitação dos condenados e torturados, que foram mais de mil; aproveitou o ensejo para reformar o sistema militar conforme os modelos mais ou menos disciplinados que admirara; mandou açoitar a imperatriz e executar seu filho Aleixo por protegerem os descontentes; implantou tudo que pôde de novo — moeda, correios, sistema escolar, estradas, canais, fábricas, minas, e até reformou o sistema eclesiástico, acabando com o patriarca ortodoxo, que era um papa cismático, interferindo a cada passo nos assuntos seculares para os censurar à sua feição, assim embaraçando a ação temporal.

Clero e nobreza

No lugar daquele patriarca colocou Pedro Magno um Santo Sínodo, por êle encarregado da administração religiosa. Também no intuito de impedir que pudesse vir a formar-se uma aristocracia de natureza a contrastar com a autoridade da coroa, associou à nobreza a condição do trabalho pela grandeza nacional, tornando aquela dependente deste. A burocracia militar e civil que daí adveio, conquanto hereditária sua nobreza, derivou a princípio seus pergaminhos e riquezas não do sangue, mas dos serviços prestados. O título de boiardo foi abolido e Pedro Magno estabeleceu mesmo que deixaria de ser nobre toda família que não tivesse feito serviço público durante duas gerações. Serviço público era sinônimo de serviço do czar, cuja autocracia era perfeita. Êle combateu quanto lhe foi possível a venalidade da administração, mas não lhe era dado extirpar a corrução, antes esta tenderia a aumentar pela falta de responsabilidade que lhe emprestava sua exclusiva dependência de um déspota que não podia humanamente tudo vigiar e tudo fiscalizar, por maior que fosse seu fervor pelo progresso nacional.

Luta com Carlos XII da Suécia

A luta de Pedro Magno com a Suécia foi tanto mais notável e gloriosa quanto encontrou como inimigo um homem do jaez de Carlos XII, de escassa reflexão, antes cegamente impetuoso, mas de uma rara bravura militar, o protótipo de um herói. O domínio sueco do Báltico congregou contra si nessa ocasião os chefes dos países vizinhos — Dinamarca, Polônia e Rússia — que mais sofriam com isso na sua expansão. Carlos XII bateu-os porém separadamente com manifesta superioridade, sendo os russos destroçados em Narva, no Golfo da Finlândia, em 1700. Pedro Magno não se deixou contudo abater pela derrota, antes reafirmou sua intenção de arrancar à Suécia o monopólio do Báltico, edificando em 1703 uma nova capital, São Petersburgo, numa ilha da foz do Neva, no fundo do Golfo da Finlândia. Em 1709 eram os suecos esmagados em Poltava no Sul da Rússia, até onde se internara Carlos XII, que foi compelido a procurar refúgio na Turquia donde só voltou à Suécia, para cair no campo de batalha, varado por uma bala que se diz não ter partido do inimigo (1718). A paz de Nystad (1721) deu à Rússia a posse das terras a leste do Báltico arrebatadas à Suécia.

A Prússia e os Hohenzollern

A Prússia nasceu em 1611 da junção de dois pequenos Estados ao sul do Báltico: um germânico, o eleitorado de Brandeburgo, o outro eslavo, o ducado da Prússia pertencente à Ordem dos cavaleiros teutónicos. O eleitorado de Brandeburgo tinha sido comprado por um dos herdeiros dos Hohenzollern, fidalgos da Suábia, dos quais um fora no século XIII feito pelo imperador burgrave de Nüremberg. lá vimos como um filho segundo da casa, que passara a residir em Berlim, após a secularização em seu proveito dos bens da ordem de cavalaria, se tornou duque hereditário. Era-o sob a suserania da Polônia; por falta de descendência do titular, o ducado passou em 1618 para os eleitores de Brandeburgo, que fora gradualmente aumentando de importância sob os Hohenzollem, com quem se acha o país por assim dizer, identificado, até que a desgraça os arrojou do trono.

Aumentos territoriais

O chamado Grande Eleitor, Frederico Guilherme, que governou de 1640 a 1688 com o mais puro absolutismo, lançou o fundamento da grandeza prussiana criando um exército permanente, que foi o núcleo do seu poderio militar. Esse exército, composto a princípio de voluntários e de recrutados à força, como qualquer outro do tempo, recebeu sob o sucessor daquele príncipe uma organização baseada sobre o serviço militar obrigatório, do qual entretanto se isentavam os nobres e os ricos, de acordo com os privilégios da época. O Grande Eleitor aumentou territorialmente seus domínios pondo pé nas terras renanas, mediante a sucessão dos ducados de Cleves e de Juliers, e pelo Tratado de Westphalia obteve a Pomerânia oriental e os bispados de Magdeburgo sobre o Elba e de Halberstadt e Min-den na bacia do Weser, servindo de marcos entre o Brandeburgo e o Reno.

O reino da Prússia

A seu filho Frederico coube alcançar, em troca do apoio prestado à Casa da Áustria na guerra da Sucessão da Espanha, a dignidade real que muito ambicionava e que lhe foi outorgada, não no Brandeburgo, mas na Prússia, que não fazia parte do império, sendo em 1701 coroado em Konigsberg. Reinou até 1713, quando lhe sucedeu Frederico Guilherme I, o denominado rei sargento, um brutamontes que fazia coleção de soldados gigantes, dava-lhes pancada, não poupando o filho, mas cumpria tão escrupulosamente o seu ofício real que por sua morte deixou a Frederico II, depois intitulado o Grande, um exército bem disciplinado de 80 000 homens e um tesouro de perto de 9 milhões de tálers, cada táler valendo três marcos. Ao mesmo tempo o mosaico de territórios iria fazendo desenhos e estes formando composição. A natureza das suas terras frias e areentas tornava a Prússia agressiva, cobiçosa de trechos mais férteis e mais hospitaleiros.

Quebra da unidade européia. O direito internacional e a defeituosa organização política • social

Rússia e Prússia foram nações mais resultados da vontade enérgica dos seus soberanos, do que da sua evolução histórica natural. Ambas constituíram importantes fatores políticos. A unidade européia deixara de ser uma realidade. Fora primeiro política sob o império romano: mas tinha-se desmanchado e ia cada dia cedendo mais o passo a uma variedade que foi de começo determinada pelas dinastias e depois o iria sendo progressivamente pelas raças e pelos povos. Os princípios do direito das gentes codificados num primeiro ensaio, em Leyden, por Hugo Grocio ou Grotius (1583-1645), não conseguiram logo engendrar o esboço de uma sociedade das nações que ainda hoje se procura organizar. O efeito do considerável desenvolvimento intelectual de então foi nulo sobre os processos políticos, que continuaram a cifrar-se na conquista militar e na intriga diplomática e assim se perpetuaram até nossos dias, por falta de uma concepção superior dos destinos da humanidade, ininterruptamente dividida numa parte sofredora e noutra parte gozadora, numa parte que manda e dispõe os acontecimentos a seu talante e segundo seu interesse, e noutra parte que obedece e morre por ambições e caprichos que lhe são alheios.

Fonte: Edições Melhoramentos, 1962.

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