Nietzsche e o cristianismo

Nietzsche e o Cristianismo
Miguel Duclós

Trabalho apresentado no CFH/UFSC 2008, disciplina Filosofia da Religião ministrada pelo Prof. Dr. Luiz Hebeche         

O objetivo deste trabalho é o de investigar
alguns aspectos conhecidos e característicos da vida e obra de Nietzsche e sua
relação com alguns outros autores, para que possamos identificar questões que
nos permitam visualizar a problemática envolvida na abordagem do Cristianismo
pelo autor. Para tanto, tomamos como mote a assertiva proposta no estudo
introdutório de Marco Vannini – erudito católico italiano estudioso do
misticismo cristão – de que  o problema religioso de Nietzsche assume a
proporção de um intenso confronto permeado pelo “desejo e identificação” e pelo
“amor-ódio”. (pg. 501)

Para pintar o quadro da presença da imagem de
Jesus na vida de Nietzsche, Vannini faz um paralelo entre seus escritos e
alguns traços marcantes de sua personalidade, expressos em episódios de vida.
Passa, por exemplo, pela identificação messiânica entre Nietzsche e Cristo
quando assina cartas como “O Crucificado” e “Dioniso” no acesso de loucura
definitivo que determinou sua internação. Seguindo o exemplo de Vannini, podemos
evocar alguns temas e episódios conhecidos da biografia de Nietzsche para
tentarmos achar um possível correspondente nos aspectos teóricos que queremos
abordar. É pertinente, contudo, lembrar que faremos isso de forma espontânea,
sem esgotarmos em referências vastas e complexas as posições assumidas. Esta
complexidade já é pensada internamente pelo próprio Nietzsche, que em diversas
passagens, cartas e parágrafos fala de si e de seus escritos, fornecendo pistas
preciosas e chaves interpretativas que devem ser levadas em conta mesmo por
quem queira pensá-lo a partir de uma posição em aparência diametralmente
oposta, como presumidamente os filósofos católicos fariam.

Embora haja esta quantidade de escritos que
apontamos, a chave para esta temática está na autobiografia
chamada Ecce Homo, em que o filósofo se propõe a explicar ao mundo sua
singularidade  auto-proclamada, certamente confirmada por muitos de seus leitores,
contemporâneos ou póstumos. Nietzsche não obteve grande fama literária em vida,
mas sua obra foi progressivamente aumentando de impacto sobretudo com os
pensadores existencialistas e a chamada “recepção francesa” de autores como
Bataille, Derrida e Foucault, que tomando o legado nietzscheano de crítica
radical a modernidade, se comprometeram a pensar a filosofia de maneira
bastante diversa da tradição. Em Ecce Homo, pois, escreve Nietzsche:

“Uma coisa sou eu, outra são os meus
livros. Antes de a eles me referir, aflorarei aqui a questão da compreensão ou
incompreensão destes escritos. Fá-lo-ei com a negligência que de qualquer modo
convém: com efeito, semelhante questão é ainda extemporânea . Eu próprio não
sou ainda atual, alguns nascem póstumos.”

"Cada filosofia é uma filosofia de
fachada", escreve o autor em Além do Bem e do Mal. "não se escrevem
livros precisamente para resguardar o que se guarda em si?". "Cada
filosofia esconde também uma filosofia; cada opinião é também um esconderijo,
cada palavra também uma máscara". Estas afirmações podem ser usadas para
duas coisas. Primeiramente para entender o esforço filosófico e filológico do
autor em seu método genealógico, que busca as condições, as causas e as
máscaras que levaram os filósofos a direcionarem seus escritos para o alto,
para o além-mundo, ou que levaram os fracos e os escravos a inverter o sentido
da palavra bom como mal e criar assim a moral. Mas serve também para entender
que o melhor do pensamento de Nietzsche não nos foi contado, e mesmo o que foi
dá margem à inúmeros erros de interpretação. Pois é preciso uma esmerada
arte-de-interpretação para entender Nietzsche, para fazer jus à sua obra ou à
sua postura perante os problemas da filosofia.

A tendência assistemática de sua forma de
exposição fornece, contudo, outros elementos favoráveis à aproximação da vida e
obra – Zaratustra é confessadamente um alter-ego literário que eclodiu num
jardim, durante o inverno de Rapallo, quando Nietzsche, em devaneio e
meditação, diz que de repente "um se fez dois, e Zaratustra passou por
mim". Em última análise, não é demais supor que é evidente que as
vivências pessoais na realidade e os traços de personalidade são a principal
fonte para a aventura de um autor na República das Letras, ou, pelo menos, para
sua mediação com ela.

Ficamos, pois, com esta questão: até que
ponto é válido pensar os conceitos de Nietzsche a partir de sua biografia?
Sendo que esta se configura de maneira tão extraordinária quanto a obra não é
surpreendente que seja tomada de forma maldosa pelo leitor médio que vê-se
obrigado a confrontar-se com Nietzsche com o aumento de sua popularidade. Estes
freqüentemente não reconhecem a validade da palavra proferida a partir da perspectiva
de um antípoda, que, com seus ares de grandeza pretende demolir às marteladas
as sólidas bases da civilização ocidental (o judaico-cristianismo, o legado
clássico e a racionalidade moderna) para proclamar a morte de Deus e do “último
homem”, conclamar a chegada do super-homem, a transmutação de todos os valores e
o triunfo da vontade de potência sobre o niilismo. Nas acusações então surge a
lembrança da loucura, a vida solitária de solteirão incurável, o
fracasso nas vidas profissional e amorosa (teve duas propostas de casamento
negadas), a intensa amizade com o compositor Richard Wagner e as enfermidade
que se lhe acometeram durante a maior parte da vida adulta – aí usando contra
ele a própria importância da saúde fisiológica que advogava; para ele a
felicidade, por exemplo, dependeria intrinsecamente de uma boa digestão. Este
retrato detrator impõe uma atmosfera rancorosa e pessimista a Nietzsche, mas o
exame de seus escritos mostra, em vários pontos, o pólo oposto: a afirmação da
vida, a revolta contra as tentativas de dogmatizar a atividade divina, a
esperança num futuro redentor para uma Europa enferma.

Nietzsche era filho de um pastor protestante-
Karl-Ludwig.  Nietzsche era um jovem ministro da Igreja Luterana e
pertencia a uma família de eclesiásticos. Desde cedo manifestou uma
personalidade introspectiva e diferente do comum, além de uma piedade e
sentimento religiosos que lhe renderam destaque nos círculos de relacionamento
infantil. É famosa uma aventura heróica de sua infância em que, no incitamento
competitivo dos meninos, algum jogou o desafio dizendo que "homem algum
poria a sua mão no fogo". Nietzsche não lhes respondeu, mas, tirando do
fogão um carvão ardente, colocou-o na palma da mão. E para sempre ficou com a
marca desta queimadura. [1]

Mas a felicidade se afastou depressa da
família. Em 1848, seu pai caiu de uma escadaria e bateu violentamente com a
cabeça nas pedras da calçada e depois eclodiu uma grave doença, enlouquecendo e
morrendo depois de um ano de suplício. Halevy  escreve: “Frederico tinha, então,
quatro anos. Os trágicos dias afetaram o seu espírito: o despertar, os soluços
que enchiam a casa, o pavor do quarto fechado o silêncio e o abandono; os
sinos, os cânticos, os discursos funerários, o caixão sepultado sob as lajes da
igreja… Por muito tempo ficou abalado, por ter tão cedo presenciado estas
coisas, visões atormentavam suas noites, e pressentia uma catástrofe próxima.”

            O
menino causava estranheza e admiração: seus colegas apelidaram-no de "o
pequeno pastor", reconhecendo no imberbe uma vocação espiritual para este
ofício. Lia para eles Bíblia em voz alta, com tanta emoção que o escutavam em
silêncio respeitoso. Vannini traz uma citação para resumir esta intensidade
notável do sentimento religioso no jovem Nietzsche:

“Tu chamaste; /Senhor, eu me apresso, / e estou/ aos pés
do seu trono./ Inflamado de amor / me impressiona tão vivamente / e penosamente
/ a tua vista, até penetrando-me o coração./ Senhor, eu estou vindo” (pg. 501)

Esta mesma fé ardorosa do menino poderia ter
subsistido de alguma forma no homem adulto? A caracterização imediata de
Nietzsche como um pensador ateísta levaría-nos de início a supor que
não. Seguindo, porém o roteiro deixado por Vannini devemos considerar alguns
fatores que fornecem insumo para esta abordagem. De fato, como apontamos alguns
escritos de Nietzsche trazem em seu estilo um tom bíblico e mesmo messiânico. Zaratustra
é escrito em uma rica linguagem poética, muitas vezes oracular. Aqui também aparece
a noção exaltada de si mesmo que Nietzsche nutria e a altura de sua missão na
terra, um destino transformador e ao mesmo tempo terrível. Sua obra magna, seu
livro “non plus ultra” é referido com estas palavras no prólogo de sua
autobiografia intitulada Ecce homo (1888):

"Entre minhas obras ocupa o meu Zaratustra um lugar
à parte. Com ele fiz à humanidade o maior presente que até agora lhe foi feito.
Esse livro, com uma voz de atravessar milênios, é não apenas o livro mais
elevado que existe autêntico livro do ar das alturas […] é também o mais
profundo, o nascido da mais oculta riqueza da verdade, poço inesgotável onde
balde nenhum desce sem que volte repleto de ouro e bondade".

Para enfatizar este ponto, notamos que Vannini,
no último item de seu estudo (pg. 515), que a obra-prima de Nietzsche é
“construída como um quinto evangelho” e “recheada de alusões e referências,
mais ou menos descobertas, à escritura e ao Salvador, a ponto de ficar cifrada
e obscura que não se encontra a chave de leitura”, esta sendo, para ele,
justamente a relação de amor-ódio de Nietzsche para com Cristo.

Inicialmente um professor acadêmico de futuro
promissor e um estudioso brilhante, participativo do círculo intelectual da
época, Nietzsche, contudo, foi se distanciando cada vez mais da vivência
intelectual oficial da Alemanha, como vemos, por exemplo, na polêmica
como Willamowitz. Nesse trajeto, um dos aspectos mais marcantes é sua total
ruptura com o sentimento religioso cultivado através dos órgãos oficiais da
sociedade. Um dos motivos do rompimento com o mestre e amigo Wagner, aliás, foi
a irritação que a reversão ao Cristianismo expressa na obra Parsifal causou nele.
Esta polêmica foi tratada na obra “Nietzsche contra Wagner”.

Em um de seus últimos livros, no Anticristo,
o ataque frontal e contundente a uma ainda poderosa Igreja é expresso de
maneira a não deixar dúvidas, como ao final de sua exposição:

“Escreverei esta acusação eterna contra o cristianismo em
todas as paredes, em toda parte onde houver paredes – tenho letras que até os
cegos poderão ler…”
(LXII)

No início do livro Nietzsche identifica-se e
revive o mito dos hiperbóreos, seres afastados, distantes, que não partilhavam
dos mesmos males que acometem os homens comuns. A admiração pelo esplendor da
civilização grega é marcante, pois, como diz no início de O nascimento da tragédia
do espírito da música, este povo conseguiu pegar a lança de onde tinha sido
jogada e atirá-la ainda mais longe. Porém esta civilização entrou em declínio
quando a tensão sutil que harmonizava os impulsos contrários – o levante
dionisíaco e a estabilização apolínea foi pervertido justamente pela ascensão
socrática da filosofia sobre a aristocracia ateniense, atuando então como
elemento degenerador. A sedimentação da Academia e do Liceu como a grande
ferramenta para pensar o mundo, por séculos foi tão profunda que, quando o
cristianismo surgiu, só conseguiu sedimentar-se teoricamente ao incorporar e
assimilar a filosofia grega clássica em sua doutrina. De maneira irônica,
Nietzsche afirma, portanto que o cristianismo é o platonismo para pobres.

A exaltação dos valores guerreiros, a
importância da saúde fisiológica, da constituição robusta, a ironia fescenina
diante do mistério – talvez sejam estes os fatores que levam Nietzsche a admirar um povo. O
cristianismo teria causado então um efeito devastador ao Império Romano – que tinha
resolvido o problema da existência de forma completa e durável – e mergulhado o
Ocidente num grande período de retrocesso. De maneira antinacionalista,
Nietzsche reconhece a culpa do povo alemão neste trajeto. Se foram os povos
bárbaros do norte os que mais tardaram a se converter para o cristianismo, também
o fizeram de maneira tão profunda e sincera que sempre figuraram de maneira
marcante nas suas alterações. A Renascença é elogiada por Nietzsche no mais
alto grau, como um golpe mortal à decadência ascética empreendida a partir de
dentro, do interior da própria Igreja. Seu sucesso, contudo, foi obstruído pela
ação dos alemães, com a Reforma Protestante – e aqui fica claro que Nietzsche
não ataca somente o catolicismo, mas também outras doutrinas derivadas da Mãe
Igreja:

Os alemães impediram a Europa de colher os últimos
grandes frutos de cultura – a Renascença. Compreende-se finalmente, será que
por fim compreende-se o que era a Renascença? A transmutação dos valores
cristãos – uma tentativa com todos os meios, todos os instintos e todos os
recursos do gênio para fazer triunfarem os valores opostos, os valores mais
nobres… Até ao presente essa foi a única grande guerra; nunca houve uma
questão mais crítica que a da Renascença – que é minha questão também –; nunca
houve uma forma de ataque mais fundamental, mais direta, mais violentamente
desferida por toda uma frente contra o centro do inimigo! Atacar no lugar
decisivo, no próprio assento do cristianismo, e lá entronar os valores nobres –
isto é, introduzi-los nos instintos, nas necessidades e desejos mais
fundamentais dos que ocupavam o poder… Vejo diante de mim a possibilidade de
um encantamento supra terreno: – parece-me que cintila com todas vibrações de
uma beleza sutil e refinada, dentro da qual há uma arte tão divina, tão
diabolicamente divina, que em vão se procuraria através dos milênios por
semelhante possibilidade; vejo um espetáculo tão rico em significância e ao
mesmo tempo tão maravilhosamente paradoxal que daria a todas as divindades do
Olimpo o ensejo de irromper numa imortal gargalhada – César Bórgia como
Papa!… Compreendem-me?… Pois bem, essa teria o sido a espécie de vitória
que hoje somente eu desejo –: com ela o cristianismo teria sido abolido! – Que
sucedeu? Um monge alemão, Lutero, chegou a Roma. Esse monge, com todos os
instintos vingativos de um padre malogrado no corpo, levantou uma rebelião
contra a Renascença em Roma… Em vez de compreender, com profundo
reconhecimento, o milagre que havia ocorrido: a conquista do cristianismo em
sua sede – usou o espetáculo apenas para alimentar seu próprio ódio. O homem
religioso pensa apenas em si mesmo. – Lutero viu apenas a corrupção do papado,
enquanto exatamente o oposto estava tornando-se visível: a velha corrupção, o
peccatum originale, o cristianismo já não ocupava mais o trono papal! Em seu
lugar havia vida! Havia o triunfo da vida! Havia um grande sim a tudo que é
grande, belo e audaz!… (LXI)

As divergências com as formas tradicionais de
cristianismo, contudo, não obstruem a hipótese de uma isenção de uma forma pura
de Cristianismo que pudesse conservar a mensagem do Salvador – se isto fosse
possível. As seguintes passagens parecem indicar que não:

– A própria palavra “cristianismo” é um mal-entendido –
no fundo só existiu um cristão, e ele morreu na cruz. O “Evangelho” morreu na
cruz. O que, desse momento em diante, chamou-se de “Evangelho” era exatamente o
oposto do que ele viveu: “más novas”, um Dysangelium.

É um erro elevado à estupidez ver na “fé”, e
particularmente na fé na salvação através de Cristo, o sinal distintivo do
cristão: apenas a prática cristã, a vida vivida por aquele que morreu na cruz,
é cristã…

Apenas Jesus teria sido cristão? Nietzsche
afirma que não, ao elaborar sua concepção do cristianismo primitivo, influência
de Tolstoi apontada por Vannini, como veremos. Porém, certamente é improvável que encontremos verdadeiros cristãos na história:

Hoje tal vida ainda é possível, e para certos homens até
necessária: o cristianismo primitivo, genuíno, continuará sendo possível em
quaisquer épocas… Não fé, mas atos; acima de tudo, um evitar atos, um modo
diferente de ser… Os estados de consciência, uma fé qualquer, por exemplo, a
aceitação de alguma coisa como verdade – como todo psicólogo sabe, o valor
dessas coisas é perfeitamente indiferente e de quinta ordem se comparado ao dos
instintos: estritamente falando, todo o conceito de causalidade intelectual é
falso. Reduzir o ato ser cristão, o estado de cristianismo, a uma aceitação da
verdade, a um mero fenômeno de consciência, equivale a formular uma negação do
cristianismo. De fato, não existem cristãos. O “cristão” – aquele que por dois
mil anos passou-se por cristão – é simplesmente uma auto-ilusão psicológica.
Examinado de perto, parece que, apesar de toda sua “fé”, foi apenas governado
por seus instintos – e que instintos! – Em todas as épocas – por exemplo, no
caso de Lutero – “fé” nunca foi mais que uma capa, um pretexto, uma cortina por
detrás da qual os instintos faziam seu jogo – uma engenhosa cegueira à
dominação de certos instintos.

Mas mais adiante diz: “O destino do Evangelho
foi decidido no momento de sua morte – foi pendurado na “cruz”. É preciso
identificar, portanto, qual a motivação deste intuito desmascarador, que vê no
cristianismo uma vontade de poder invertida, deturpada, a aproveitar-se do
poder conceitual religioso, dos dogmas divinos, para um proveito pessoal dos
padres e clérigos. Mas antes é curioso notar que, assim como não ataca a vida
de Jesus Cristo diretamente, Nietzsche tem palavras mais brandas para o
islamismo e o budismo:

“Se o islamismo despreza o cristianismo, tem mil razões
para fazê-lo: o islamismo pressupõe homens…” (LIX)

De forma talvez semelhante a Nietzsche, o
próprio Corão também destaca a degeneração da Igreja em relação ao mote inicial
de sua fundação, o exemplo e os ensinamentos de Cristo. O livro dos islâmicos
se afirma explicitamente corrobador do Tora judaico e do Evangelho, porém, a
nova lei de Jeová ditada agora ao mundo árabe através do profeta Maomé através
do mensageiro Gabriel, tornou-se antagonista histórica do catolicismo
Ocidental:

“27 Então, após eles, enviamos outros
mensageiros Nossos e, após estes, enviamos Jesus, filho de Maria, a quem
concedemos o Evangelho; e infundimos nos corações daqueles que o seguem
compaixão e clemência. No entanto, seguem a vida monástica, que inventaram, mas
que não lhes prescrevemos; (Nós lhes prescrevemos) apenas compraz a Deus;
porém, não o observaram devidamente. E recompensamos os fiéis, dentre eles; porém,
a maioria é depravada” (Corão 57ª SURATA)

Nietzsche também se orgulhava de conseguir
pensar a Europa através do Espírito asiático, e mais-que-asiático, conservando
de alguma maneira, portanto, a recuperação das milenares doutrinas orientais
que Schopenhauer havia empreendido junto à história da filosofia. Embora
discorde do niilismo negativo dos Budistas, escreve no Anticristo:

“Esses estados fisiológicos produzem uma depressão, e
Buda tentou combatê-la através de medidas higiênicas. Prescreveu a vida ao ar
livre, a vida nômade; moderação na alimentação e uma cuidadosa seleção dos
alimentos; prudência em relação ao uso de intoxicantes; igual cautela em
relação a quaisquer paixões que induzem comportamentos biliosos e aquecimento
do sangue; finalmente, não se preocupar nem consigo nem com os outros. Encoraja
idéias que produzam serenidade ou alegria – e encontra meios de combater as
idéias de outros tipos. Entende o bem, o estado de bondade, como algo que
promove a saúde.” (XX)

“As necessidades do budismo são um clima extremamente
ameno, muita gentileza e liberalidade nos costumes, e nenhum militarismo;
ademais, que seu início provenha das classes mais altas e educadas. Alegria,
serenidade e ausência de desejo são os objetivos principais, e eles são alcançados.
O budismo não é uma religião na qual a perfeição é meramente objeto de
aspiração: a perfeição é algo normal.”  (XXI)

Vemos que neste olhar compreensivo para estas
religiões não há uma pretensão de destruição total nem a denúncia do perigo
mortificador que representam, como há para o cristianismo, como vemos na
chocante frase a seguir:

“Artigo Terceiro – O local amaldiçoado onde o
cristianismo chocou seus ovos de basilisco deve ser demolido e transformado no
lugar mais infame da Terra, constituirá motivo de pavor para a posteridade. Lá
devem ser criadas cobras venenosas” (lei contra o Cristianismo)

A moral cristã é entendida, portanto, como
força inimiga da vida, repressora da vontade de potência , e uma influência
apolínea que desvirtuou a humanidade por quase dois mil anos. A perversão do
Evangelho de Cristo, revolucionário por essência, começa com a normatização da
doutrina da Igreja. Nietzsche dirige palavras duras contra todo padre que faz
da atividade divina um ofício, mascarando sua própria luta interna contra o
corpo, sua própria dependência e inquietações. A influência de Paulo e
Constantino nesta questão é notada por Vannini (pg. 54) e textual no
Anticristo, quando Nietzsche escreve:

“Paulo, com aquela insolência rabínica que permeia todos
seus atos, deu um caráter lógico a essa concepção indecente deste modo: “Se

Cristo não ressuscitou de entre os mortos, então é vã toda a nossa fé” (XLI).

Vannini, ao analisar a influência do escritor
russo Leon Tolstoi em Nietzsche, ocorrida a partir da leitura de “Ma religion”,
indica que foi este quem primeiro denunciou este evangelista pela
“mistificação” e “traição” ocorrida no cristianismo. Em “Ma Religion” Tolstoi
relata uma experiência pessoal que ilustra o conflito entre existente entre o Estado
os ensinamentos da vida de Cristo, assim como entre a ação constituída da
Igreja e os “verdadeiros” ensinamentos de Cristo, como nota Vannini. Tolstoi trouxe
para o universo literário elementos do cristianismo primitivo. Após sua
“conversão mística” de 1878, realizou uma série de ações em benefício de
algumas seitas camponesas que mantiveram intocada, através de uma tradição oral
paralela, uma doutrina cristã de caráter diverso ou dissidente ao epicentro
romano ou mesmo à Igreja ortodoxa russa. É notória, por exemplo, sua ação
política em favor dos Doukhobors, pleiteando seu assentamento junto ao
território canadense através de uma grande campanha, e doando a eles as rendas
advindas do seu romance “Ressureição”. Após esta sua "conversão",
Tolstoi dedicou-se a uma vida de comunhão com a natureza. Deixou de beber e
fumar, tornou-se vegetariano e passou a vestir-se como camponês. Convencido de
que ninguém deve depender do trabalho alheio, buscou a auto-suficiência e
passou a limpar seus aposentos, lavrar o campo e produzir as próprias roupas e
botas.

A denúncia é, portanto, que através do
cristianismo de Paulo o ascetismo triunfou sobre a força renovadora do
Evangelho. Cristo reformou a religião judaica, estendendo-a para outros povos,
unificados pela sua palavra, pregando o otimismo, o deus do amor e a permissão,
por exemplo ao questionar o costume dos saduceus de respeitar o sábado como dia
santo:

O sábado foi estabelecido por causa do
homem, e não o homem por causa do sábado; De sorte que o Filho do Homem é
senhor também do sábado"
(Ev. Marcos 2.28)

Contra o servilismo repetitivo diante de uma
lei esvaziada de sentido, este renovador da lei judaica propôs uma alternativa
de liberdade e fartura, como podemos observar também no milagre da
multiplicação dos pães. É este sentido primitivo que parece ter sido desviado
com a leitura ascética do legado cristão. A supremacia da alma sobre o corpo já
era tradicional na teorética filosófica, tendo sido demonstrada pelo Sócrates
de Platão no diálogo Fédon. Durante o Medievo, contudo, isto adquiriu um
caráter tão coercitivo que deu margem à formatação das mais saborosas utopias,
como a da francesa do país da Cocanha. Na Renascença, encomiada por Nietzsche
no Anticristo no mais alto grau, vemos também uma insurgência contra a primazia
da escassez, como na história do gigante Gargatua, de Pantagruel, do monge Rabelais,
que retrata a fartura do gigante contra o ascetismo, a desmesura hedonística
contra a rigidez e o rigor da vida espiritual da figura do sábio anacoreta.

A sensualidade era associada à vitória do
demônio. Para vencê-la, ou para impressionar os não-santos, os ermitões
estigmatizaram os prazeres do sentido, associando a excitação ao pecado e ao
mal. Ao espalharem que o homem era gerado em pecado, fizeram com que qualquer
ser humano, desde o seu nascimento, nos princípios mesmo da sua vida, se
sentisse marcado pelo sinal da transgressão, porque até o ato que os gerava,
conúbio carnal, foi estigmatizado como algo repugnante. Nietzsche denuncia, portanto,
o caráter nocivo que exerceu tal doutrina, assumida na plenitude por Santo
Agostinho,  que provocava em cada crente uma sensação ininterrupta de “má
consciência”, cujo verso do poeta do século de ouro espanhol Calderon
de la Barca bem exemplifica: "a maior culpa do homem é ter nascido".
Em várias passagens Nietzsche escreve contra estes sábios, como no artigo
quarto das lei contra o cristianismo:

“Pregar a castidade é uma incitação pública à
antinatureza. Qualquer desprezo à vida sexual, qualquer tentativa de maculá-la
através do conceito de “impureza” é o maior pecado contra o Espírito Santo da
Vida.”

Isto em relação a moral triunfante dos santos. Porém, o que poderíamos considerar de um
cristianismo que admitisse dentro da doutrina de salvação do Evangelho, os mais
torpes tipos humanos, com seus defeitos e máculas reais, longe de um tipo ideal
de pureza e expectativa infantil de privilégios divinos? Friedrich Nietzsche
ficou impressionado com a leitura de outro mestre russo, Fiódor Dostoievski, no
ano de 1887, quando entrou em contato com suas obras. Isto é  relatado, por
exemplo, na carta ao amigo Peter Gast, do dia 07 de março daquele ano:

“Dostoievsky veio a mim da mesma maneira
que antes veio Stendhal: por completo acidente. Um livro casualmente folheado
numa loja, um nome que eu nunca tinha ouvido falar antes – e então a súbita
consciência de alguém que tinha encontrado um irmão.

(…) quatro anos na Sibéria,
trancafiado, entre insensíveis criminosos. Este período foi decisivo. Ele
descobriu o poder da sua intuição psicológica; e mais, seu coração
sensibilizou-se e tornou-se profundo neste processo. Seu livro de memórias
deste período, La maison des morts [A Casa dos Mortos] é um dos livros mais
"humanos" já escritos. (…) Eu primeiro li (…) duas novelas curtas
["A proprietária"] e ["Notas do subterrâneo" ]: o primeiro
uma espécie de música estranha, o segundo uma verdadeira pincelada de gênio
psicológico – uma assustadora e cruel imitação do délfico "Conhece-te a ti
mesmo", mas lançada com tamanha audácia espontânea e alegria em seus
poderes superiores que fiquei profundamente embevecido de contentamento. (…)”
[2]

Muitas vezes esta ligação do filósofo alemão
com o escritor russo é dissecada pelos comentadores especializados. Uma famosa
frase  de Dostoievski contida no livro Irmãos Karamazov parece nos fornecer
ainda mais insumos para fortalecê-la: “Se Deus não existe e a alma é mortal,
tudo é permitido”. O principal motivo do rompimento de Nietzsche com o músico
Richard Wagner foi a insistência deste com o cristianismo. O filósofo empreende
uma crítica radical dos valores da civilização ocidental expressos com força no
platonismo e no judaico-cristianismo. Tomando isso como ponto de baliza, nos
perguntamos será que o entusiasmo de Nietzsche resistiria à uma análise fria
dos desdobramentos da literatura de Dostoievski?

Dostoievski
também se põe numa postura crítica em relação à sociedade moderna,
especialmente no seu assentamento sobre as certezas e o otimismo dos
pressupostos da razão iluminista. Esta situação dá o tom a alguns trechos do
livro Memórias do Subsolo, como no seguinte:

“(…) dois e dois não são mais a vida, meus senhores,
mas o começo da morte. Pelo menos, o homem sempre temeu de certo modo este dois
e dois são quatro, e eu o temo até agora.”[3]

O homem do subsolo no livro ataca de forma
feroz o progresso e a ciência, mas também o atraso e a loucura. Sem dúvida a
denúncia da inconsistência do projeto iluminista, que concede à razão o
privilégio total para a interpretação de mundo é mais um ponto de aproximação
com Nietzsche, assim como também a temática envolvida  no advento do niilismo
russo – Nietzsche pode ser considerado um niilista num certo sentido, o do
niilismo positivo, necessário para mover a alavanca que retira o homem da
prisão abstrata imposta pelo condicionamento moral e os sistemas de valores.
Mas se afasta do niilismo ao eleger a vida como o único valor em si mesmo, e
proclamar a superioridade fisiológica de tudo quanto aumenta a vontade de
potência e afirma a vida, em detrimento de tudo que a nega e dilui a sua força.
Nesse iterem está um dos pontos da rejeição de Nietzsche em relação à ascese
cristã, que nulificaria o corpo ao afirmar a superiodade da alma, como no
legado do Fédon de Platão. E também as “desconfianças mesquinhas” em relação à
Terra, ao afirmar a existência de “mundos-verdade”, extra-mundos superiores ao
mundo sensível, para onde a alma migraria e receberia recompensa ou castigo
após a vida, de acordo com a sua conduta na Terra.

Alguns dados da biografia do autor, mais uma
vez, podem nos fornecer uma base para esta abordagem interpretativa. Por
exemplo, tendo anteriormente sido salvo pelo Czar, Dostoievski se aproximou de
Konstantin Pobedonostsev, jurista russo ligado ao estado e à Igreja,  contrário
às influências européias na Rússia e a favor de um nativismo enaltecedor do
passado e das tradições próprias do país, expressão no movimento
Pochvennichestvo. Também na idade madura manteve uma coluna regular no
periódico conservador Grazhdanin (“O Cidadão”).

.
          Dostoievski passou pela terrível sensação de saber e esperar sua morte
iminente, todavia a pena capital que lhe foi inicialmente imputada amainou-se
graças à intervenção direta do czar russo Nicolau I. Neste longo período de
trabalhos forçados, passou por provações terríveis, em um ambiente altamente
insalubre, em companhia de marginais e assassinos da pior espécie. O impacto
profundo destas experiências transpassa, naturalmente, para a sua obra
literária. A relação da vida do escritor com seus escritos dá margem para
animadas discussões, mas por mais tênue e indecifrável  que ela seja é certo
contudo que ela existe. No caso de Dostoievski é preciso se perder no campo de
suposições, que não caberiam aqui, já que ele possui uma obra de nítido
caráter  autobiográfico, a Recordações da Casa dos Mortos (1862).

Porém, no caso de Dostoievski, sua opção
final é pelo cristianismo ortodoxo russo. Isto está bem marcado, por exemplo,
no seu livro Crime e Castigo. As teorias do protagonista de Rodion Românovitch
Raskolnikov contra o sistema e a mediocridade da vida cotidiana e das pessoas
comuns encontram, como sabemos, uma negação exemplar no desenlace do romance.
Dostoievski escreveu alguns de seus romances na forma de capítulos semanais
para folhetins, e por isso teve muitas vezes a oportunidade de rechear a trama
com detalhes e episódios paralelos, chegando a um ponto de tal densidade
psicológica que por vezes se compara o seu poder de representar a alma humana
com as descobertas da psicanálise freudiana, posterior, pela sua vastidão e
complexidade. Mas as investidas e as conjecturas explosivas de Rodion a favor
da grandeza da vida, e contra a estabilidade monotóna das opções de vida em
sociedade, com suas regras e leis às vezes são tão burlescas e radicais que
podem ser encaradas como uma caricatura, construído para desmerecê-la. O fato
de assassinar, na trama, uma senhora inocente, cujo único erro aparente é o da
usura, nos põe logo em uma posição de desconfiança e repulsa em relação a este
anti-herói, por mais sedutoras que sejam suas excentricidades. Se o castigo
pelo crime que cometeu é mesmo necessário e o autor encontra uma típica
redenção cristã através do amor oferecido pela pura prostituta, não podemos
dizer que o romance é também uma defesa complexa e apaixonado do
conservadorismo? – já que todo o percurso de Rodion é exposto para que se
mostre a sua impossibilidade e a inevitabilidade de sua captura.

Da mesma forma, não seria a novela Memórias
do Subsolo exatamente o que o nome diz: uma voz desprezível que se levanta das
profundezas, não para que a ouçamos e nos deixemos influenciar por ela,
percebendo as sutilezas contraditórias da mente, mas para que se evidencie o
lado escuro da alma humana? Então encontramos motivos para que este seja
desprezado e controlado, assim como os mesmos aspectos nefastos de
personalidade e caráter que Dostoievski entrou em contato, deixando-o
horrorizado, quando recebeu o severo castigo pelos seus “crimes” junto ao
Círculo de Petrashevsky e conviveu com os criminosos que não tinham mais nada a
perder. Com este foco, a sua frase sobre Deus, que citamos, não se torna uma
exaltação promissora da liberalização dos costumes fundadas no relativismo e no
fim da moral, mas sim uma advertência severa sobre a gravidade das
conseqüências possíveis caso seja adotada como verdadeira.

            De acordo com a leitura de
Vannini, no mundo de Dostoievski Nietzsche teria encontrado o “cristianismo
autêntico”, aquele que Paulo “pervertera pela base”. (pg. 508). Apesar da
exatidão e extensão da problemática apontada por Vannini é perigoso identificar
nos dois autores em relação a uma opção clara em relação ao cristianismo, como
fizemos com o autor russo, já que no autor alemão, como ele mesmo admite, a
relação de Nietzsche com o cristianismo é dúbia e complexa, e deve ser tomada como
mais uma chave de interpretação para os que aproximam de sua obra.

 

BIBLIOGRAFIA

 

BÍBLIA SAGRADA. Novo Testamento. Edições
Paulinas, 1973.
DOSTOIÉVSKI, Crime e Castigo. Tradução de Paulo Bezerra. Editora 34.
DOSTOIÉVSKI, Memórias do Subsolo. Tradução de Boris Schnaiderman. Coleção
Leste. São Paulo: Editora 34, 2000.
HALÉVY, Daniel, Frederico Nietzsche. Tradução de Jerônimo Monteiro. Coleção
Perfis Literários. Ed. Assunção ltda.
MAOMÉ, Corão. Ebook disponível em http://www.culturabrasil.org/alcorao.htm .
Acesso em 02.07.2008.
NIETZSCHE, O Anticristo. Ebook com tradução de André Díspore Cancian a partir
da versão em inglês, disponível em
http://ateus.net/artigos/filosofia/o_anticristo.php . Acesso em 02.07.2008

NIETZSCHE, Obras Incompletas.
3.ed. Seleção de textos de Gérard Lebrun e tradução de Rubens Rodrigues Torres
Filho. São Paulo: Abril Cultural, 1983 (Os Pensadores).
SCHNAIDERMAN, Boris. Leão Tolstoi – antiarte e rebeldia. Col. Encanto Radical.
Ed. Brasiliense, 1983.
VANNINI, M. “Friedrich Nietzsche – uma relação de amor-ódio com Jesus e uma surpreendente
tentativa de identificação” in ZUCAL, S. (org.) Cristo na Filosofia
Contemporânea. – vol. 1 De Kant a Nietzsche. TR. De Pe. José Raimundo Vidigal.
Ed. Paulus, 2003.

 

 

 

 


[1]
Os dados biográficos de Nietzsche foram obtidos, principalmente, a partir da
leitura de sua primeira biografia de fôlego, publicada pelo francês Daniel
Halèvy em 1909;

[2]
Tradução nossa da versão em
inglês publicada no site The Nietzsche Channel. Disponível em http://www.geocities.com/thenietzschechannel/nlett1887.htm
. Acesso 01/12/2007.

[3]
Dostoievski, Memórias do
Subsolo
. Editora 34. São Paulo: 2000

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