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5. MOVIMENTOS EM PROL DA REFORMA SOCIAL

Pelos fins do século XIX começou a ganhar terreno a
idéia de que não era suficiente a democracia política. A responsabilidade dos
gabinetes perante os parlamentos e a concessão do direito   de   votar   a  
todos   os   cidadãos   pareceram  assuntos de importância relativamente
pequena enquanto os operários permanecessem à mercê de um sistema industrial
baseado numa concorrência implacável. Conseqüentemente, em alguns países
iniciou-se a agitação em prol daquilo que algumas vezes se denomina democracia
econômica. De acordo com a definição comum, a democracia econômica encarna a
idéia de que todos os homens devem ter as mesmas oportunidades de desenvolver
ao máximo as suas capacidades latentes. Não é sinônima do antigo conceito
liberal de igualdade perante a lei, o qual, como observava ironicamente Anatole
France, garantia ao pobre como ao rico igual direito de dormir debaixo das
pontes e mendigar o seu pão. Democracia econômica significa que não é lícito
arrebanhar crianças nas fábricas para serem exploradas por empregadores
egoístas, que os velhos não devem ser atirados ao monte de rebotalhos
imprestáveis quando toda a energia de seus corpos foi exaurida pela máquina
desumana, nem é justo que os operários arquem com todo o peso dos acidentes da
indústria, do desemprego e da doença. Em suma, ela envolv ma modificação bastante
drástica do ideal do laissez-faire, que

p

 umpre
não esquecer, por outro lado, que o declínio do laissez-faire não foi resultado
exclusivo do movimento em prol da democracia econômica. A forma original
frequentemente assumida pela modificação no continente europeu foi o 
protecionismo, introduzido pela burguesia em ascensão no intuito de afastar a
concorrência da lnglaterra. Era o protecionismo por vezes acompanhado de
subsídios diretos, de que encontramos exemplo na liberalidade dos governos
italiano e francês para com a indústria da seda e vários ramos da agricultura.
Em nações como a Alemanha, a Itália e a Rússia, as estradas de ferro, as linhas
telegráficas e telefônicas ou foram instaladas pelo estado ou nacionalizadas
mais tarde, tendo em vista principalmente a eficiência militar. Na França, as
indústrias manufatoras de tabaco e de fósforos foram encampadas pelo estado
como fontes de renda pública e eram administradas como monopólios do governo.
Mesmo uma boa parte da legislação social promulgada nos países continentais se
inspirava em razões de nacionalismo, militarismo e paternalismo. Os governos
desejavam conquistar a lealdade de todas as classes do povo e assegura

guerra, farto suprimento de carne para
canhão. A primeira das grandes potências a pôr em vigor um programa completo 
de legislação social  foi a Alemanha,  sob a orientação  do seu astuto mas
despótico chanceler, o  Príncipe de Bismarck (1815-98).    Não são difíceis de
penetrar as razões que levaram a Alemanha a tomar a dianteira neste assunto.   
Ao contrário da Inglaterra e da França, nunca fora afetada de maneira profunda
pelo liberalismo do século XVII, não tendo por isso fortes tradições
individualistas ou de laissez-faire. Enquanto os seus filósofos políticos
pregavam insistentemente, a sujeição do indivíduo ao estado, os seus
economistas inculcavam doutrinas de auto-suficiência nacional e de
paternalismo. O próprio Bismarck afirmava que era dever do estado regular todas
as funções sociais de acordo com o interesse nacional e zelar pelos cidadãos
mais fracos "para que não fossem atropelados ou espezinhados na estrada da
vida". Tinha, porém, outras razões ainda para se empenhar no que parecia
ser uma defesa dos direitos dos operários. Estava ansioso por solapar a
crescente voga do socialismo roubando-lhe uma parte da sua força. Num discurso
pronunciado no Reichstag, confessou francamente o seu intento de segurar os
operários contra a doença e a velhice, de modo que "esses senhores   (os
social-democratas)  entoariam  em vão o  seu  canto  de sereia". Além de
tais objetivos, tinha também em mente finalidades militares. Desejava fazer do
proletário alemão um soldado leal e, até certo ponto, salvaguardar-lhe a saúde
dos efeitos debilitantes do trabalho fabril. O programa de legislação social de
Bismarck foi iniciado em 1883-84 com a adoção de leis que seguravam os
operários contra a doença e os acidentes. Tais leis foram logo seguidas de
outras que estabeleciam uma rígida inspeção fabril, limitavam o emprego de
mulheres e crianças, fixavam um máximo de horas de trabalho, instalavam
agências públicas de emprego e seguravam os operários contra a incapacidade
decorrente da velhice. Em 1890, quando Bismarck foi forçado a abandonar a vida
pública, a Alemanha tinha adotado, com exceção do seguro contra o desemprego,
quase todos os elementos constituintes do padrão de legislação social que a partir
dessa

tornou familiar à maioria das nações ocidentais.
Outros  países  do   continente  europeu  não  tardaram  a  seguir  o exemplo
da Alemanha.    Em 1885 a Áustria estabeleceu uma jornada máxima de onze horas
nas fábricas e dez horas nas minas, e em  1887-88 instituiu o seguro dos
operários industriais contra a doença e os acidentes.   A França e a Itália só
mais tarde se juntaram a esse movimento, mas o programa que então
adotaram foi de alcance mais amplo. Uma lei francesa de 1892 não só
regulamentava o emprego de mulheres e crianças mas também prescrevia uma
jornada máxima de dez horas para todos os trabalhadores; em 1905 esse limite
foi reduzido para nove horas. Outros decretos do parlamento francês asseguravam
o serviço médico gratuito para todos os trabalhadores e suas famílias,
ofereciam proteção às atividades dos sindicatos e obrigavam os empregadores a
indenizar os operários por danos físicos. A pedra de coroamento desse sistema
de legislação foi acrescentada em 1910 com a aprovação de uma lei que instituía
pensões de velhice não só para os operários industriais, de acordo com a
prática usual, mas também para os empregados domésticos e trabalhadores
agrícolas. A série de leis promulgadas na Itália equivalia mais ou menos a
essa, salvo quanto a ausência de serviço médico gratuito. As leis italianas
foram completadas, no entanto, por uma outra datada de 1912, a qual
nacionalizava os seguros de vida e continha

incentivadoras das cooperativas de consumo. Devido às
suas fortes tradições individualistas, a Inglaterra atrasou-se de vários anos
em relação às outras grandes potências da Europa Ocidental. Houvera, é certo,
algum progresso anterior, exemplificado por leis que proibiam o emprego de
mulheres e crianças no trabalho subterrâneo das minas; mas o governo inglês não
adotou medidas   amplas   de  reforma   social   senão   depois   de   1905,  
quando   o partido  liberal   rejuvenescido   subiu   ao  poder.    Sob   a 
liderança  de Gladstone,  a velha geração  de liberais,  que  representava
principalmente as classes comerciais, estivera comprometida com  os 
princípios  do   laissez-faire.  Suas  energias  tinham  sido absorvidas em
larga dose porroblemas   de   reforma   política   e   pela   questão   do  
home ride (autonomia) para a Irlanda. Mas em 1898, com a morte de Gladstone, a
direção do partido passou para mãos mais moças. Alguns dos novos líderes —
Herbert Asquith, David Lloyd George, John Morley e Winston Churchill — eram
idealistas entusiásticos, resolvidos a mover uma "guerra sem quartel"
à miséria. Subindo ao poder em 1905, esses ardentes reformadores decidiram
alijar as idéias fora de moda adotadas pelo seu partido e transformar a
Inglaterra num paraíso de equidade econômica para todos. Durante os anos que se
seguiram, até o início da Primeira Guerra Mundial, conseguiram fazer aprovar o
mais notável programa de legislação reformista desde a Revolução Gloriosa. Em
primeiro lugar vieram a Lei de Indenização dos Trabalhadores, de 1906, e a Lei
de Aposentadorias, em 1908. A seguir, a Lei das Câmaras Gremiais, de 1909, que
autorizava omissões especiais a fixar os salários mínimos dos operários dos
sweatshops (oficinas em que se impunha um excesso de trabalho com pequeno
ordenado) ; três anos depois, o princípio dos salários mínimos foi estendido à
indústria mineradora do carvão. Em 1911 o gabinete liberal fez passar no
Parlamento a grande Lei Nacional de Seguros, que introduzia um sistema de
seguros contra doença para todos os assalariados e estabelecia o seguro contra
o desemprego para os operários de obras e construções. As disposições dessa lei
contra o desemprego atingiam mais de dois milhões de trabalhadore

sujeitos às consequências
dos períodos de crise. A essa lista de reformas sociais mais correntes do
governo liberal devem ser adicionadas outras quase sem precedentes. Em 1901 a
Câmara dos Pares dera a sua famosa decisão no caso da Estrada de Ferro de Taff
Vale, afirmando que os sindicatos operários podiam ser responsabilizados pelos
danos causados à propriedade no decurso das greves.    Em parte para aplacar os
chefes trabalhistas, o governo liberal fêz aprovar a sua Lei de Litígios do
Trabalho de 1906, colocando os fundos dos sindicatos ao abrigo das ações
judiciais por perdas e danos. Em 1909 o parlamento liberal promulgou uma lei permitindo
a desapropriação das zonas de cortiços e autorizando  as  autoridades  
locais   a  tomar  as   medidas  necessárias  para oferecer moradias condignas
aos pobres. Essa lei estabeleceu o precedente para a construção de habitações
coletivas em enorme escala nos anos seguintes, especialmente no período
posterior a 1918. Entre as mais significativas reformas sociais do regime
liberal contam-se certas medidas incluídas no orçamento de Lloyd George para
1909. Nesse notável programa fiscal, David Lloyd George não só se propunha
aumentar as taxas do imposto comum sobre a renda mas também cobrar uma
sobretaxa sobre a renda dos ricos. Recomendava ainda que o governo confiscasse
20% do produto da valorização indébita da terra e lançasse um pesado imposto
sobre todas as terras não aproveitadas cujo valor fosse estimado em mais de 50
libras esterlinas por acre (0,4 hectare). Tais medidas tinham um duplo
propósito: aumentar a receita para poder destinar maiores verbas às
aposentadorias e diminuir as grandes fortunas. Esperava-se que o imposto sobre
a valorização e sobre as terras não aproveitadas contribuísse para quebrar o
monopólio latifundiário dos nobres mais ricos — de magnatas como o Duque de
Westmmster, que possuía 600 acres em Londres, e do Marquês de Bute, proprietário
de metade da área de Cardiff, com cerca de 20.000 casas construídas. Repelido
pela Câmara dos Pares, o orçamento de Lloyd George transformou-se afinal em lei
depois que os liber

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