A Arte Românica – História da Arte

Arte Românica
Arte Românica

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Pierre du Columbier – História da Arte 

A Arte Românica

Os Preliminares

O Império do Oriente mantinha, durante algum tempo pelo menos, a sua supremacia numa parte do mundo civilizado, o Império do Ocidente sucumbira, tanto em consequência de sua própria decomposição como em resultado dos golpes dos invasores. No fim do século V, cessou a autoridade romana na Gália. Mas a organização administrativa de Roma não desapareceu do mesmo modo e muitas vezes forneceu quadros de funcionários, que todos aceitaram de comum acordo, à falta de quem os substituísse. E, sobretudo, compreende-se hoje cada vez melhor que a irradiação de Bizâncio não cessou de atingir os países que marginam o lago mediterrâneo e até os próprios recém-vindos. Muitas vezes, esta arte sumptuosa parece seduzi-los bem mais do que as ruínas imponentes de Roma. E é também do Oriente bizantino que veio o monaquismo, cuja acção devia ser decisiva para a civilização do Ocidente.

 Arte dos Nômadas

Teriam os próprios povos migradores trazidos para os territorios em que se espalhavam, alguma coisa mais do que a desordem ? Se, na qualidade de nómadas, são desprovidos de arquitectura, possuem, em contra–partida, uma ourivesaria bastante surpreendente para o mundo ‘ aonde chegam e que é bem conhecida por numerosos achados feitos nos túmulos. Entre outros tesoiros notáveis, apareceram os de Childerico (fim do século v), em parte hoje perdido, de Petróssa na Valáquia, de Guarragar, perto de Toledo, pertencente aos reis visigodos. Esta ourivesaria caracteriza-se por peças de oiro com encaixes que prendem pedras mais ou menos preciosas ou simples vidri-lhos de côr. O conjunto consta de um desenho geométrico, de que. a figura humana está praticamente excluída e em que a fauna, relativamente rara, é muito estilizada.

A bem dizer, verificou-se que estas obras, chegadas à Europa ocidental, são pouco originais e constituem apenas uma forma abastardada daquilo a que se chamou, à falta de um termo mais perfeito, a arte dos Nómadas, na qual há a distinguir duas modalidades principais, a sita e a sarmata. Os Sitas fazem-se notar pelo hábil estudo do reino animal; as suas jóias de oiro reproduzem veados, panteras, ursos, águias, adaptados sem dúvida à sua função ornamental e submetidos frequentemente a regras de simetria, mas esta elaboração deixa, apesar de tudo, transparecer muita vida e espontaneidade; o artífice não hesita em representar os seus modelos empenhados em lutas violentas. Quanto aos Sarmatas, são os mestres da ourivesaria com engastes.

Esta arte dos nómadas suscita muitos problemas. Estas gentes errantes das estepes tiveram forçosamente relações com as civilizações vizinhas: a persa, a grega, a china. Quem deu? Quem recebeu? E provável que tais perguntas não comportem respostas simples. A existência, na ourivesaria persa, de belas peças com engastes, como a taça de Chosroés, permitira supor que a Pérsia dera talvez em grande parte origem à arce dos Nómadas. Hoje há tendência para proceder à revisão de tal parecer, mas deve confessar-se que os indícios são muito vagos e as balzias pouco numerosas.

Arte Irlandesa

Há tendência para ligar também à inspiração das tribos migradoras — à falta, em suma, de melhor hipótese a aventar — a curiosíssima ornamentação linear que se desenvolveu quase exclusivamente na Irlanda, nos séculos vil e viu, nos manuscritos dos conventos e, de maneira secundária, na pedra. Daí, a decoração irlandesa, sem dúvida transportada pelos monges, espalhou-se no continente, onde, embora atenuada, exerceu alguma influência na iluminura, no mosteiro de Saint Gall por exemplo. Na sua feição mais exuberante (evangeliario de Kelles ou bíblia de Lindisfarne), esta caligrafia, que dir–se-ia brotar ao acaso, mas que é dum equilíbrio muito habilidoso e subtil, cobre a página com uma apertada rede que não permite nenhum repouso nem nenhum vazio. A figura humana, aliás pouquíssimo frequente, reduz-se aqui a simples ornato gráfico.

Do que se construiu até ao século IX, quase nada resta, o que não quer dizer que não houvesse alguma coisa. Observaram até alguns que constitui um erro olhar em bloco essas épocas como épocas de barbárie: o século vil, por exemplo, alcançou uma prosperidade’bastante considerável. Mas a fúria dos homens e a sua devoção, que aniquilaram os monumentos para os substituir por outros reputados mais belos, obriga-nos a recorrer com certo perigo aos textos. Deles se conclue clarissimamente que florescia então uma arquitectura de tipo bizantino, isto é, concebida quase apenas para a ornamentação, o que explica perfeitamente, sem necessidade de recorrer a hipóteses arriscadas dum pretenso eclipse da técnica, o material de construção medíocre, constituído por pedras miúdas, que se encontra nas ruínas muito incompletas dos edifícios. Pelo contrário, os conhecimentos parecem ter sido muito superiores ao que, durante muito tempo, se pensou. Os principais tipos de abóbadas (de berço, de aresta) eram empregados, pelo menos, em pequena escala, e a cúpula estava bastante espalhada.

a importância, senão quanto ao período que imediatamente a precedeu e que foi com efeito um período perturbado, pelo menos quanto ao conjunto dos séculos anteriores. Ela manifestou-se, entre

Renascença Carolíngia

No século IX, produziu-se — para empregar a palavra consagradr pelo uso — a renascença carolíngia, de que se exagerou provavelmente outros aspectos, por um regresso as antigo, cujos efeitos se fazem sentir mais no domínio das letras do que no das artes plásticas.

Dois monumentos quase inteiramente conservados, embora um deles haja sido muitíssimo desfigurado pelos restauros, dão testemunho desta renascença carolíngia no princípio do século IX: a Catedral de Aix-la-Chapelle (796-814) e a Igreja de Germigny-les-Prés (699-818), perto de Chateauneuf-no-Loire. A bem dizer, são um e outro de tipo bastante excepcional, construídos ambos sobre planta central. Em Aix, achamo-nos perante uma capela palatina com tribunas, para cuja construção Carlos Magno seguiu a moda do tempo, que consistia em despojar das suas colunas os monumentos antigos. Apesar de tudo quanto se disse recentemente, o arquitecto, Eudes de Metz, inspirou-se por certo em São Vital de Ravena ou em qualquer edifício análogo. Em Germigny, é um oratório de quatro lóbulos, com torre quadrada ao centro. São grandes os pontos de relação com certas igrejas da Arménia, mas não está de forma nenhuma provado que a transmissão tenha sido directa.

Por infelicidade, não subsistiu nenhuma igreja importante do tipo basilical, ainda que estas igrejas estivessem por certo muito mais espalhadas do que as outras. Pode, até certo ponto, remediar-se esta lacuna graças à planta muitíssimo pormenorizada e muitíssimo clara que se fez, em 819, da Abadia de Saint Gall, cuja igreja tem duas ábsides, uma a leste e outra a oeste, disposição que subsistirá por muito tempo nas regiões renanas.

Primeira Arte Românica

.Os historiadores mais recentes da arte românica, atribuem, na sua formação, importância considerável a um conjunto de igrejas edificadas no século x e no princípio do século XI nos países situados ao norte do Mediterrâneo: Catalunha, Astúrias, Lombardia, Sabóia, Borgonha e até a Suíça. São edifícios de dimensões em geral modestas, bastante rústicos na sua composição, maciços e robustos, abobadados ou não e cuja ábside se recorta muitas vezes num bloco de alvenaria de ângulos rectos. Apresentam elas características de construção e de decoração curiosamente constantes: por um lado, são feitas com inferior material de construção, constituído por pedras miúdas; por outro lado, encontra-se, no seu exterior, um sistema de arcaturas cegas, que engrinaldam a parte inferior das cornijas e descem a intervalos regulares, como faixas lisas verticais. Esta ornamentação chamou-se lombarda, porque o seu principal centro de difusão foi a Itália do norte. De lá irradiaram os mestres «Comacine», cujo nome se não sabe ao certo se é um nome de origem ou se provém duma espécie de jogo de palavras, «Cum maximes», mas que, em qualquer caso, eram chamados dos pontos mais distantes da Europa. No entanto, parece que, pelas datas, a Catalunha levou talvez a dianteira à Itália. Nesta região, e sobretudo no norte de Espanha, as características da arte a que se chama agora «primeira arte românica» concordam com certos usos visigóticos como o arco ultrapassado, e com práticas moçárabes, à medida que a reconquista progride e que os artífices que trabalharam sob as ordens de mestres muçulmanos e que se designam por aquele nome se refugiam nos territórios cristãos. E na Catalunha também que a primeira arte românica toma excepcionalmente aspecto monumental, por exemplo na igreja de Santa Maria de Ripoll, consagrada em 1031. O que se não deve todavia esquecer é que a passagem dos pequenos edifícios da pequena arte romana para as grandes igrejas nem sempre reveste grande nitidez. Depois, se, em raros países, esta passagem é provável, há que ter em conta todos os outros, e o emprego de alguns motivos não basta para nos persuadir de que eles devam muito a tais tentativas. E caso para perguntar se, também aqui, os arqueólogos não abusaram do sistema discutível que consiste em considerar os pequenos monumentos como esboço e ensaio dos grandes.

O Florescimento

O grande impulso produz-se na segunda metade do século XI e sobretudo na época de transição entre este século e o imediato. Surgem então em toda a Europa os vastos templos: Cluny III (1088-1109), Santo Hilário de Poitiers (1045-1080), Saint-Eoy de Conques (1050-1108), Santo Estevão de Caen (1064-1087), Saint Sernin de Tolosa (1076–1119), Santiago de Compostela (1078-1 128), Santa Maria no Capitólio, de Colónia (consagrada em 1065), Espira (1030-1106), Lincoln (1^072-1092), Durham (1093-1 130), Pisa (1063-1118).

Depois, chega, mais ou menos sem interrupção, a segunda vaga, a do século xn, que compreende edifícios não menos admiráveis como Vézelay (1104-1132), São Lázaro de Autun (1 120-1178), Saint Front de Périgueux (reconstrução: 1120-1173), a velha Catedral de Salamanca (1120-1178), a Catedral de Parma (1130-1150), a de Worms (1171-1234), a Sé Velha de Coimbra (meados do século XII).

 

Quando se procuram definir as características comuns destas diversas igrejas, começam as dificuldades. Precisamente, por comparação com a arte gótica, a arte românica distingue-se por uma grande variedade e pela manifestação de numerosas iniciativas locais.

Pode dizer-se no entanto que à predominância do ornato sucede o primado da pedra. Há a preocupação de construir melhor, porque já se não esconde o que se constrói. Por outro lado, o edifício tomou formas muito menos elementares, articulou-se em superfície como em altura. Se a forma basilical consegue impor-se a tal ponto que só em monumentos de pequenas dimensões se adopta o plano central, esta evolução não se produz sem que o plano central se combine com a planta axial na ábside da igreja. O deambulatório com capelas radiantes dispostas em torno do coro, que era já adoptado em São Martinho de Tours, sem dúvida antes de 1014, espalha-se cada vez mais e permite com efeito, pelo emprego duma série de elementos arredondados justapostos, grande variedade, tanto no interior como no exterior. Depois, em altura, a ascensão, progressiva dos vários elementos é estudada com grande cuidado; a ábside de certas igrejas do Auvergne, como São Paulo de Issoire, mostra a que perfeição podem chegar os arquitectos românicos na disposição das massas.

O sistema geral de proporções está longe de se opor radicalmente ao da Antiguidade. Salvo na escola normanda, as dimensões verticais não se exageram nunca à custa das horizontais. E sem dúvida por esta razão que as igrejas românicas possuem uma harmonia muito sedutora, até quando as suas dimensões são medíocres (diferentemente, muitas vezes, das pequenas igrejas góticas): não visam a surpreender mas a satisfazer e encontram-se verdadeiras obras-primas entre as «belas camponesas» (como dizia Miguel Angelo a propósito dum pequeno templo florentino), no Auvergne em Orcival, em Saintonge no Aulnay, nos confins do Bourbonnais em Veance. Poderiam citar-se aqui mil testemunhos.

Por certo, o problema da cobertura desempenha papel considerável e exerce grande influência na estrutura do monumento; no entanto, tal consideração não deve ser olhada como exclusiva, porque a Itália conservou o tecto em certos edifícios capitais e porque uma das escolas românicas mais importantes, aquela sem dúvida cuja acção foi preponderante na sequência da história da arquitectura, a escola normanda, não usou da abóbada nas suas mais belas igrejas.

Não deve tampouco perder-se de vista que o problema da cobertura com abóbada está inteiramente ligado ao da iluminação e que tal problema não consistia apenas em dar às igrejas um modo de cobertura apto a diminuir a frequência dos incendios, mas também em obter este resultado sem as escurecer excessivamente. Quase sempre, as soluções adoptadas constituem compromissos entre estas duas exigências.

 

Se é certo que se conheciam antes da época românica os diversos métodos para cobrir de pedra um edifício, cabe no entanto aos construtores românicos a glória de os ter aplicado a extensões cada vez maiores, de os ter aperfeiçoado e de haverem mostrado nestedomínio uma audácia que vai até ao exagero.

Os sistemas foram muito diversos (ver fig. 12). O mais simples e o mais frequente na época românica é o das abóbadas obtidas por uma ou várias curvas que se deslocam perpendicularmente ao plano em que são traçadas, de forma tal que o eixo de deslocamento é o eixo longitudinal da igreja. Obtém-se desta maneira a abóbada de berço, que é de pleno cintro quando a curva geratriz é uma semi-circunferência ou quebrado quando provém de duas curvas, em geral de dois arcos de circunferência, que se cortam, determinando uma aresta (fig. 12 A e B).

As abóbadas de berço exercem, ao longo das paredes paralelas ao eixo que as suporta, um esforço de deslocação. A não querer contentar-se com paredes maciças, é na maneira de neutralizar esses esforços que se manifesta o engenho do construtor; tal neutralização faz-se em princípio por meio de naves laterais, que tem por vezes sensivelmente a altura da nave principal (caso frequente no Poitou e na Provença) e que são aliás divididas em rés-do-chão e tribunas (fig. 12). Aparte algumas janelas parcimoniosamente distribuídas à nascença da abóbada, a luz não chega senão pelas naves laterais, cujas paredes exteriores, reforçadas por contrafortes, têm apenas aberturas bastante estreitas.

Com a abóbada de berço fizera-se também uma tentativa cujas vantagens práticas pareciam consideráveis mas que, de facto, não teve imitadores: foi em Tournus. Consistia em adoptar, para o deslocamento dos arcos cuja curva produzia o berço, eixos perpendiculares ao eixo principal da igreja. Tinha-se, dessa maneira, uma série de berços que se contrapunham mutuamente e não era necessário opor-lhes forte resistência senão nas duas extremidades da nave. Nada impedia de rasgar janelas nas paredes laterais que não suportassem qualquer esforço de deslocação. O que decerto se opôs à generalização do processo foi uma razão estética, porque tais ondulações vinham desagradàvelmente cortar o comprimento da igreja.

Suponhamos agora que a nave é dividida em certo número de rectângulos adjacentes (que podem ser quadrados). Cada um destes rectângulos poderá ser coberto por uma abóbada de aresta ou por uma cúpula. A primeira é obtida teoricamente pelo encontro dos dois berços, um paralelo e o outro perpendicular ao eixo principal da nave, e cuja intersecção desenha duas arestas (fig. 12 C). Neste sistema, os impulsos acham-se localizados nas extremidades das arestas, em quatro regiões bem determinadas. Eis uma solução quase ideal, porquanto a parede vertical que medeia entre dois pontos de apoio pode ser rasgada de aberturas à vontade ou quase. Duas escolas empregam largamente a abóbada de aresta para cobrir grandes edifícios: a escola renana, em que, como sucede em Espira, as abóbadas de aresta abrangem duas arcadas, pois o pilar intermédio é um pilar «fraco», e a escola da Borgonha, em que a cada arcada corresponde uma abóbada de aresta. Nesta época, porém, a arte de aplicar contrafortes para amparar as abóbadas nem sempre ia de par com a arte de as construir. Em Vézelay, as abóbadas ameaçavam ruína e, na época gótica, foi necessário muni-las de arcos botantes.

Quanto à subdivisão duma nave alongada em certo número de quadrados recobertos de cúpulas (fig. 12 D e E), tem ela contra si certo ilogismo que já fizemos notar a propósito de Tournus. No entanto, obteve êxito, mas só num território muitíssimo restrito, cujo centro é o Périgord e que se estende até Augoumois e Sain-tonge. Com efeito, estas elegantes cúpulas sobre pendentes (que frequentemente não são visíveis do exterior) deveriam impor uma planta diferente, mais centrada, como a de Saint-Front de Péri-gueux, imitação muito provável de São Marcos de Veneza.

Acrescente-se ainda que, salvo na Borgonha, Onde o arco quebrado está muito difundido, adopta-se geralmente o pleno cintro não só nas abóbadas mas tambémn o traçado dos arcos, a tal ponto que, para muita gente, ele caracteriza falsamente a arquitectura românica.

Uma das belezas das igrejas românicas reside nas suas torres — torres lanterneiras ou torres sineiras — quadradas ou poligonais em França, piramidais ou muitas vezes redondas na Alemanha onde a sua multiplicidade muito contribui para o pitoresco dos edifícios, de que fazem parte orgânica, enquanto a Itália mantém de preferência a tradição do seu isolamento, como se vê por exemplo em Pisa, cuja célebre torre inclinada merece admirar-se por motivos bem diversos da sua inclinação perigosa.

Torna-se difícil falar em geral das fachadas românicas, cuja variedade é extrema; no entanto, salvo na escola normanda, em que a verticalidade é muito vincada, as divisões horizontais são muitíssimo acentuadas e possuem uma empena cuja inclinação não parece excessiva.

Decoração Escultórica  

Mas este assunto das fachadas leva-nos a tratar da sua decoração, porque, no edificio, e a parte em que ela se encontra quase exclusi-mente. Frequentemente em Itália e excepcionalmente em França, no Puy, por exemplo, o colorido das pedras toma certa importância ; todavia a decoração românica é, antes de tudo, uma decoração, escultórica.

E aliás impossível indicar qualquer regra quanto à sua extensão: vai-se de Notre-Dame-la-Grande de Poitiers. em que a decoração tudo invadiu, a Santo Estevão de Caen, cuja fachada é nua e muda.

Esta decoração concentra-se frequentemente em volta das aberturas e sobretudo em torno das portas que se rasgam ao fundo dum portal cuja parte anterior e mais larga apresenta colunas verticais e voltas de abóbada.

Abstracção feita das figuras, de que preferimos falar mais adiante, o repertório ornamental da arte românica é de extrema riqueza. Compreende primeiramente uma vasta colecção de ziguezagues, de torçais, de estrelas, de asnas, de dentes de serra, em suma, de motivos inanimados. Também não falta o ornato vegetal, mas muito elaborado e transformado, de tal forma que, quando se observam, por exemplo, os numerosíssimos capitéis românicos filiados no coríntio, se tem a impressão de que o artífice, ao deformar um modelo já esculpido, mais procurou afastar-se do que aproximar-se do tipo natural deste capitel.

Embora, na elaboração deste ornato, a arte antiga tenha podido desempenhar um papel que está longe de ser insignificante — cita-se, como exemplo clássico, a catedral de Autun, em que o motivo duma porta romana foi copiado quase servilmente, e sobretudo as igrejas da Provença, que dela conservaram o espírito mais do que a letra — foi ao Oriente que coube a parte preponderante: a pululação dos monstros proclama-o. Convém sublinhá-lo: por vezes, esses monstros podem ter um nome, o dum vício, o do diabo, ou possuir uma significação alegórica, e os iconógrafos têm dispendido com eles o melhor da sua subtileza; mas, na maior parte dos casos, são inteiramente gratuitos. Esta decoração, cuja origem não pode ser discutida, embora se mantenha muitas vezes obscuro o seu modo de transmissão, conseguiu chegar até à arte românica por diversas vias: manuscritos, marfins, tecidos, etc. Em Bayeux, nota-se até a imitação precisa de objectos chinos. Impossível confundi-la com algumas sugestões directas da arte árabe, como os modilhões com motivos de cavacos ou aparas, muito espalhados em Espanha e em certas igrejas de França que balizam mais ou menos a estrada de Santiago de Compostela.

No portal, a escultura orna sobretudo o tímpano e as voltas da abóbada. Em muitos casos, os artistas românicos tiveram a feliz ideia de recobrir as voltas da abóbada de uma decoração puramente ornamental. Outras vezes, decoraram-nas com figuras e parecem hesitar entre a disposição perpendicular à volta da abóbada ou radiante e a disposição paralela. Embora a primeira pareça mais lógica, ela capitulará ante a segunda que há-de prevalecer mais ou menos exclusivamente no período gótico. E também durante a época românica, em Saint-Denis (cerca de 1135) e mais tarde em Chartres, que se observa a transformação das colunas que emolduram as portas. Figuras esculpidas apoiam-se nelas, depois formam as chamadas estátuas-colunas, a princípio rígidas, como que a recordar o suporte que substituem, depois já menos hirtas.

Assim, a arquitectura levóu-nos necessariamente às fronteiras da escultura. Seria porém erróneo julgar que toda a escultura românica é monumental.

Não foi sequer pela escultura monumental que começou uma nova primavera da figura humana. Primavera que é o fenómeno mais característico desta época.

De facto, observam-se duas correntes distintas, uma das quais a mais antiga, diz respeito ao metal, enquanto a outra, a mais recente e a mais completa, diz respeito à pedra.

Escultura de Metal

A primeira irrompe no noroeste da Europa, na região do Mosa, na do Reno e nas regiões vizinhas da Alemanha. Neste país, existiam exce-

lentes fundidores de bronze, e as cabeças de leão das portas Aix–la-Chapelle demonstram uma habilidade já consumada em fundir o metal. Ora, por alturas do princípio do século XI, aparece em Hil-desheim uma quase obra-prima: as portas de bronze da igreja de São Miguel, que datam de 1015. Nelas se vêem modeladas pequenas cenas, com uma liberdade extrema, que sugere o impressionismo. O nu — a bem dizer mais adivinhado do que imitado — é aqui expresso com franqueza nas personagens de Adão e Eva. Enquanto os corpos são esculpidos em baixos-relevos, as cabeças desprendem-se do fundo e muitas vezes tornam-se dele independentes. Os membros podem ter o aspecto de fósforos, alongar-se desmedidamente, mas tudo se salva, graças a um sentido vivíssimo do movimento e a uma observação incompleta, mas, por assim dizer, chocarreira. O estilo lembra muito os esboços, em extremo livres que se encontram nos manuscritos de veia mais ou menos popular.

Relativamente pouco depois, no mesmo lugar, sob a inspiração do Bispo Bernevvart funde-se um monumento de espécie muito diferente: o simile dum círio pascal recoberto de baixos-relevos em espiral, inspirados nos da Coluna de Trajano. O estilo é por completo diferente, mais aristocrático, mais esmerado. Encontrar-se-á todavia nele o mesmo espontâneo encanto ?

Em boa verdade, são obras de ourives. Temos a certeza da intervenção constante destes nos bronzes que se encontram, perto de um século mais tarde, na região do Mosa: um dos mais antigos em data e dos mais belos pela nobreza tranquila dos movimentos é a piabaptismal de São Bartolomeu de Liège, executada por Rénier de Huy. Estes ourives da região do Mosa, os mais célebres dos quais são Nicolas de Verdun e Godefroy de Huy, espalharam por outro lado, através da Europa, os seus relicários, ao mesmo tempo vigorosos pela modelagem e preciosos pelos esmaltes que os ornavam.

Ora esta escultura de bronze, que começara com tanto brilho e que não pecava, ao que parece, pelo amaneirado, não conseguiu libertar-se completamente da ourivesaria. Os trechos de grandes dimensões, de forma estatuaria, como o leão de Brunswick (cerca de 1166), são excepcionais. A falta, sem dúvida, de haver resolvido o problema da fusão das estatuas, a arte do bronze não conseguiu então, como o tinham feito os Gregos criar, uma verdadeira escultura. O que ela fez, mesmo até ao fim do século XV, careceu de grandeza, foi sempre um tanto acanhado.

Não é todavia de forma alguma certo que não seja igualmente a ourivesaria que encontramos nas origens da escultura monumental de pedra ou estuque, Sabemos pelo menos que, em certas circunstâncias, o estuque foi a ourivesaria do pobre e que, em particular na Catalunha, certos frontais de altar desta matéria macaqueiam obras de metal. E, se pensarmos na perfeição quase clássica de obras como a coluna de São Bernward, os primeiros balbúcios da escultura de pedra parecem extremamente bárbaros. Por outro lado, o Sr. Bréhier chamou a atenção para as cabeças e para as estátuas-relicários de metal, bastante espalhadas no Auvergne e no Limousin, cuja obra-prima é, sem dúvida, a de Sainte-Foy de Conques (antes do ano 1000).

Escultura de Pedra

 A Renascença das figuras de pedra parece produzir-se em França mais ou menos simultaneamente em duas regiões: no .Languedoc e na Borgonha. No Languedoc, se se fizer abstracção de tentativas informes, como a padieira de Saint-Genis-des-Fontaines (cerca de 1020), que não é aliás, na região catalã, única no seu género, vê-se, por alturas de 1096, surgir as esculturas de Saint–Servin de Tolosa, e, tanto nesta igreja como no Museu dos Agostinhos, onde se reuniram os restos de .edifícios destruídos, esta cidade apresenta uma série ininterrupta de obras que culminam com o magnífico tímpano de São Pedro de Moissac (1 125-1 130). Mas de cerca de 1095 são também os admiráveis capitéis de Cluny, nos quais se figuram os tons da música e que atingem repentinamente o nível de obra-prima, pela nobreza e naturalidade de atitudes, a tal ponto que se pretendeu, durante muito tempo, remoçá–las vinte e cinco ou trinta anos, até que as razões extrínsecas mais ponderosas levaram a adoptar uma data que nada tem de inverosímil, se se admitir nessa grande oficina a presença dum homem de génio.

 

Quando se quis determinar a própria essência da escultura românica, atribuiu-se, não sem justeza, grande importância àquilo a que o Sr. Focion chamou a lei do enquadramento: o enquadramento arquitectónico submete as formas a si próprio. Que significa isto, senão que os escultores românicos possuem raro talento decorativo e que o põem à prova em superfície e linearmente (porque a época românica é relativamente pobre em estatuária) ? Tais artífices são desprovidos da plasticidade que caracterizava os Gregos e que permitia a estes guarnecer uma superfície determinada conservando às figuras naturalidade perfeita. Não é menos verdade que esta escultura merece igual e por vezes maior admiração quando tenta libertar-se do enquadramento, por exemplo num tímpano, em que é mais livre do que num capitel (e, ainda assim, os capitéis de Cluny testemunham uma liberdade acentuada).

Há-de observar-se então que, se as proporções parecem bastante indiferentes ao escultor românico (o que é uma herança do homem-ornato), já não sucede o mesmo com o movimento. Este é expresso ao mesmo tempo com uma audácia e uma inabilidade que se conjugam em exageros saborosos, A Eva de Autun rasteja como um réptil e o São Pedro e o Isaías de Moissac e mais ainda 0 Isaías de Souillac parecem dançar. Depois, estes escultores falhos da experiência ousam abalançar-se a um dos mais difíceis problemas do baixo-relevo: a representação de personagens sentadas, colocadas de frente. Nada de surpreendente que esbarrem com dificuldades.

Como não aprofundaram o estudo do homem ao passar do vestuário ao corpo, é sobretudo à roupagem que se atêm para exprimir o movimento. Conhecem eles um tipo de roupagem, mais ou menos largo e pesado, que devem ter achado nos modelos romanos (primeiras esculturas de Saint-Sernin de Tolosa, igrejas provençais), mas preferem outro de pequenas pregas muito juntas. Quanto a este, é licito admitir de preferência que tira a sua origem de manuscritos, pois dir-se-ia muitas vezes com efeito traçado à pena em volta de centros que marcam as saliências. Certamente, esta arte da iluminura, uma das mais adiantadas, senão a mais adiantada da época, foi objecto de atento estudo da parte dos escultores. Serviu de modelo à composição de certos tímpanos, como o Sr. Mâle o demonstrou quanto ao de Moissac.

Esta composição é, por vezes, na sua maneira, tão hábil como a dum Grego. Por infelicidade, rápidamente os escultores românicos resvalaram na deplorável facilidade de que os seus sucessores góticos tanto abusaram, recortando a superfície deste tímpano em faixas horizontais e até por vezes verticais, a fim de o fragmentar em vários campos elementares. Assim, o tímpano de Carennac, posterior ao de Moissac, marca, em relação a este último, uma regressão decorativa. Um dos temas favoritos é o Cristo de majestade, rodeado dos símbolos dos Evangelistas, o tema apocalíptico da visão de São João rodeado dos vinte e quatro anciãos. Mas, enquanto em Moissac estava em comunicação livre com o resto da cena, em que, apesar da sua estatura superior, participava, ele encerra-se estritamente, em Carennac, no Mans, em Chartres ou em Saint-Trophime de Aries, na chamada moldura em forma de amêndoa.

Outro motivo bastante espalhado, a Ascensão, que se vê em particular em Mauriac ou em Angoulême e que, precisamente por causa do isolamento da personagem principal, não difere muito do Cristo de majestade Enfim, o Juízo Final, bastante mediocremente tratado em Conques, toma uma vida poderosa na Catedral de Autum, mais tardiamente (cerca de 1130), embora o próprio Cristo não tenha aqui a beleza majestosa do de Beaulieu, que estende audaciosamente o seu braço de juiz, como se afastasse as próprias convenções que o tinham detido.

Por vezes, estas convenções, às quais se submete o escultor, permitem-lhe obter, entre a arquitectura e a sua própria arte, um entendimento de esquisito sabor. Eis o que se observa em particular nas estátuas-colunas. Aqui, a queda vertical das dobras do vestuário, o próprio esquematismo do corpo, cuja largura varia insensivelmente até ao seu alongamento, acentuam a função da estátua que, em suma, é quase apenas um apoio. No portal oeste de Chartres, no Portal dos Reis, uma grande doçura vem acariciar os rostos, tirar-lhes essa expressão rude que as cabeças românicas apresentam com excessiva frequência e que se torna fatigante. Atinge-se aqui, na verdade, um equilíbrio maravilhoso e instável: a estátua, é humana sem deixar de lembrar a sua função. Dum lado e do outro dos portais góticos, ver-se-ão obras-primas mais livres e desenvoltas. Produzirão elas porventura uma impressão superior a esta serenidade ainda rígida?

Pintura

É-nos necessário certo esforço para imaginar, nos edifícios românicos, o revestimento pintado que cobria o interior das paredes. Com efeito, ele foi-nos conservado apenas, na sua integridade, em raros casos, e nós habituámo-nos à aspereza e à tonalidade da pedra, que teriam decerto parecido frios aos contemporâneos. No entanto, estes fragmentos são bastante numerosos para que nós distingamos, nas paredes como nos manuscritos — que parecem ter desempenhado, relativamente à parede mural, um papel semelhante à escultura — duas tendências que apontávamos já na época bizantina, Primeiramente, uma arte oficial, cuja magnificência lembra muito a arte «áulica» dos Imperadores do Oriente: abundância de púrpura e de oiro, personagens hieráticas, composição rígida e rebuscada. Este género, na iluminura, beneficiou largamente com os esforços de Carlos Magno, que mantinha a chamada Escola do Palácio e cujos herdeiros, neste domínio, foram quase sempre as escolas alemãs da dinastia otoniana. Téveros e Reichnau foram centros importantes dum estilo luxuoso e cuidado, que muito influenciou, segundo parece, o que se praticava em Cluny durante o século XI e de que testemunham não somente os manuscritos mas ainda as pinturas murais da capela vizinha de Berzé-la-Ville.

Mas, paralelamente, não cessou de se desenvolver a corrente popular, talvez de origem síria, em cujas obras o movimento endiabrado e o sentido vivo e rápido do esboço resgataram uma negligência acentuada e uma ordenação deficiente. Eis o que se observa nó Livro dos Salmos de Utrecht (século ix), em que a espontaneidade parece por vezes tocada de humor. Que esta juventude um pouco selvagem, um pouco ácida, amadureça e se tempere um tanto e ter-se-á uma obra-prima como o Hortus Deliciarum da Abadessa Herrad de Landesberg, cujo original foi infelizmente destruído e que, por datar da segunda metade do século xii, pertence já evidentemente ao período gótico.

Há ainda a considerar uma escola em extremo curiosa, que em vão se tentaria ligar às precedentes e cuja importância e originalidade profunda o Sr. Mâle evidenciou: a escola catalã — cheia de influências moçarabes, também muito movimentada’e que, pelas suas tintas violentas e profundas, aplicadas à maneira de esfregaço, com um sentido extraordinariamente poderoso da imaginária, é na verdade incomparável. Cerca de 1050, ela produziu uma estranha obra-prima, o Apocalipse de São Severo, que se gravou poderosamente na imaginação dos homens até muitíssimo longe do lugar da sua origem. A França não é particularmente rica em pinturas murais, mas a Alemanha conservou bastantes até aos nossos dias. Na ilha de Reichnau, o estilo hierático e o estilo familiar justapõem-se. Enquanto em Oberzell, por alturas do ano 1000, o segundo deles leva a melhor, em Niederzell, em meados do século xii, é o primeiro que triunfa. Quando, em Prufüing, perto de Ratisbona, a composição é muito equilibrada, o esboço torna-se cada vez mais familiar em Linz, na Renânia. Do mesmo modo, em França, Berzé–la-Ville, dependência de Cluny, de gosto bizantino, opõe-se a Saint–Savin de Gartemp, cuja veia exuberante faz desculpar todas as mesquinhezes de forma.

Quanto ao vitral, irmão da pintura e por vezes irmão inimigo, não subejam dúvidas de que o seu uso era corrente nos séculos X e XI, mas só nos restam dele pobres e raros testemunhos.

As Grandes Escolas Românicas

A necessidade de agrupar geograficamente as grandes construções românicas impôs-se constantemente e as divergências neste particular só dizem respeito ao número e à extensão de tais escolas. Seria tão inútil negar-lhes a existência como multiplicar-lhes excessivamente o número.

Um dos grupos mais homogéneos e mais imponentes é o das igrejas normandas e^anglo-normandas, cuja obra capital, Santo Estevão de Caen ou Abadia-dos-Homens, foi começada em 1064, pela mesma ocasião que a Abadia-das-Damas — e cuja construção foi conduzida mais rapidamente.

A abadia de Jumièges, mais antiga e que devia ser igualmente majestosa, subsiste ainda, mas em estado de ruína. Em Inglaterra, nova possessão dos conquistadores normandos, Durham começou a ser edificada em 1093.

Abstendose de dar uma solução ao problema da abóbada e contentando-se com o tecto de madeira, a escola normanda evitava sem dúvida muitas dificuldades: podia construir naves ao mesmo tempo espaçosas e elevadas e iluminá-las largamente por janelas altas. Nestas naves, adopta-se muitas vezes a alternância dum pilar forte e dum pilar fraco, que dá ao interior um ritmo sem monotonia, muito agradável, mas que se explica dificilmente numa arquitectura tresabobadada, pois os apoios têm funções equivalentes.

No interior, a sobriedade é extrema: quase não há escultura nem ornatos. Em Santo Estêvão de Caen, a fachada é dividida por quatro contrafortes, que, sem corte horizontal, se erguem do nível da terra até aos cimos, acentuando assim o movimento ascensional desenhado pelas altas torres de flechas agudas: esta igreja não destoaria entre os edifícios góticos.

 

A Borgonha possuiu uma das mais vastas igrejas da Cristandade, tão grande como São Pedro de Roma, a famosa Abadia de Cluny, construída, na sua última forma, de 1088 a 1109 e cujos restos, onde se anichou uma parte da pequena cidade moderna, nos enchem de assombro. Cluny, metrópole cristã, tem uma autoridade espiritual que não é ultrapassada por nenhum poder religioso e, se a arquitectura românica possui um carácter monástico muito acentuado, é sobretudo aos Clunicienses que ela o deve, embora se torne difícil distinguir, como o pretenderam alguns, uma arte que lhes seja própria. Mas estes grandes construtores da Borgonha querem precisamente o que se faz de melhor: igrejas amplas, bem iluminadas, abobadadas. Os que trabalham para eles não receiam nenhuma audácia, nenhuma novidade, não hesitam em rasgar janelas nas paredes, nos pontos de nascença das abóbadas. Em Cluny e nas igrejas que a imitam, Paray-le-Monial ou Saulieu, estas abóbadas são de berço quebrado. Em Vézelay (1104-1132), a abóbada de aresta fornecerá a solução que será a da época gótica e que se tornará de todo perfeita quando se souber utilizar mais amplamente os contrafortes para apoio das abóbadas.

Além disso, a Borgonha rivaliza com o Languedoc no que respeita aos grandes conjuntos escultóricos: Vézelay e Autun não serão ultrapassados. Mais reflectido, o tímpano de Vézelay possui maior equilíbrio e perfeição, mas o de Autun vale pelo seu verdor: grandes personagens desajeitadas, demónios caricaturais que pesam as almas.

Penetrando em toda a Europa pelas suas abadias filiais, pelos seus priorados, muito contribuiu Cluny para difundir a influência dos arquitectos franceses; todavia, estava reservado a outro ramo, um ramo reformado da família beneditina, construir uma doutrina artística, bastante negativa em fim de contas, mas que contribuiu para uniformizar o estilo cisterciense: quase sem ornatos, de altar–mor despido de enfeites, as igrejas da Ordem de Cíteaux reconhecem-se sobretudo por estes caracteres, que conservaram aliás no período gótico, porque os próprios Cistercienses foram grandes propagadores desta arte. O sentido da grandeza não lhes faltava aliás de nenhum modo e a Abadia de Fontenay, construída por eles de 1130 a 1147, constitui um conjunto puramente arquitectónico, notavelmente articulado e concentrado.

O Languedoc, ocupa o segundo lugar nos conjuntos escultóricos. Não se pode separá-lo do Norte de Espanha. A evolução nestas regiões segue dois caminhos tão exactamente paralelos que surgiram muitas vezes conflitos quanto à data das respectivas obras, resolvidos em geral, ao que parece, em favor da França (x). Se os escultores de Sain-Sernin de Tolosa, que, nos últimos anos do século xi, atestam esforços apaixonados, tanto para um calmo poder plástico como para a mais rigorosa definição das atitudes, se dispersaram bastante, resta, em contrapartida, a prodigiosa maturidade de Moissac, o fantástico pilar de Souillac, sonho oriental materializado na pedra de França. Conques, no Rouergue, inesquecível pelo seu local, não possui a mesma distinção. Do outro lado dos Pirinéus, são os capitiés do claustro de Silos, de data muito discutida, e sobretudo a ilustre basílica de Santigo de Compostela, lugar priviligiado de peregrinação para toda a Cristandade, que oferece à nossa vista a sua «Porta dos Ourives», cuja decoração é infelizmente construída por pedaços justapostos, por vezes admiráveis, e o seu «Pórtico da Glória», que data do fim do século xii e cujo autor, um certo mestre Mateus, por excepção conhecemos. Na Catalunha, em Ripoll, toda a fachada é decorada de baixos-relevos imitados das miniaturas da Bíblia de Farfa.

(1) Tal solução será definitiva? A atitude da escola francesa de arqueologia perante os trabalhos do americano Kingslay Porter não deixa de surpreender um pouco.

O Languedoc adoptou a abóbada de berço, mas já apontámos a singularidade arquitectónica aqui verificada e que abrange as regiões vizinhas: a série de igrejas de cúpula que, de Cahórs e Sain-tes, passando por Périgueux e Angoulême, se distribuem numa faixa estreita, com alguns edifícios isolados no exterior, como Soli-gnac e, mais tarde, Fontvrault. A mais antiga é a de Cahors, consagrada em 1119 ; a mais célebre Saint-Front de Périgueux (reconstruída depois do incêndio de 1120). Embora estas cúpulas não sejam construídas como cúpula orientais, é difícil admitir que o desejo de obter efeitos análogos não tenha influído muito na adopção desta forma. Concluir duma diferença de estrutura uma ausência de imitação seria desconhecer o mecanismo desta. Assim, sabe-se hoje que a cúpula era usada na época merovíngia: não é, pois, necessário procurar uma origem única às cúpulas da Aqui-tânia. Quanto a Saint-Front, a analogia da sua planta com a de São Marcos de Veneza é clamorosa. E, sem dúvida, estas explicações de ordem estética têm muito mais probabilidades de ser verdadeiras do que a explicação materialista que fez depender a construção destas cúpulas dum calcáreo especial — de que mais ninguém se ocupou depois. Porque, após um facto puramente local e que não durou mais de um século, as enfiadas de cúpulas desaparecem, por haverem passado de moda. A sua adopção não tinha sido aliás muito franca, pois, salvante em Saint-Front, elas não desempenhavam exteriormente nenhuma função no aspecto da igreja.

Somos assim levados ao Poitou, a Saintonge e, de modo gera^ ao resto da França. Nesta região, adoptaram-se raramente os edifícios muito vastos. Muitos são desprovidos de naves laterais e, quando estas existem, sobem por vezes tão alto como a nave central, que não é iluminada directamente, mas desse modo, dispõe no entanto de luz bastante profusa. Manifesta-se por vezes aqui um gosto pronunciado pela abundância decorativa: uma fachada como a de Notre-Dame-la-Grande, em Poitiers, limitada pelos seus poderosos pináculos entumescidos, com as aberturas profundas das suas arcaturas e dos seus portais e os lavores que a recobrem, mostra uma exuberância quase indu. Todavia, a escultura é aqui de qualidade bastante medíocre e vale muito mais tal igreja de Saintonge, como de Aulnay. O êxito destes santuários de Saintonge, até dos mais pequenos, resulta da mestria no emprego dos elementos não humanos. Há, entre eles, obras-primas de abundância, e, ao mesmo tempo, de segurança e vigor.

Mais tarde, a Provença ergueu igrejas estreitas, apoiando as abóbadas, que são muitas vezes de berço quebrado, ora em pilares muito próximos uns dos outros, com naves laterais abobadadas em quarto de círculo, ora em grossas paredes. Quanto aos conjuntos escultóricos, existem poucos tão equilibrados como a fachada de Saint-Gilles e o claustro de Saint-Trophime — um dos mais deliciosos de toda a época românica — e nos quais a inspiração antiga se tenha conservado tão pura. Na Provença, a palavra «românico»» com tudo o que implica de dependencia relativamente à civilização latina, assume o seu mais amplo sentido.

 

No Auvergne e certamente em parte por causa da dureza das pedras que aí se empregam, triunfa uma sobriedade escultórica que vai por vezes até à pobreza. Na arquitectura, o sólido Auvergne não é de forma alguma o país das aventuras. Constrói-se ali muito bem, mas sem audácia: sobre as naves laterais, alcandoram-se tribunas que reforçam tão bem a nave central que esta fica mergulhada em sombra; mas, na elevação exterior das igrejas, esta região é incomparável e o crescendo dos volumes da ábside em Issoire, por exemplo, ou em Saint-Nécnaire, a maneira como se combinam com a torre-lanterna, a ligação ao corpo central das capelas em ressalto — problema tão delicado — tudo isso é tratado com perfeita mestria. Uma decoração colorida: um friso azul, negro e vermelho faz muitas vezes ressair as cornijas.

Todavia, o monumento mais impressionante e mais teatral do Auvergne, a Catedral do Puy, não se integra em nenhuma categoria bem determinada, edifício único quase oriental, que ergue a sua fachada de riscas alternativamente brancas e pretas por sobre a campina que o rodeia e deve à sua construção sobre uma escarpa abrupta boa parte da sua originalidade.

Com a França, as duas partes essenciais da arte românica são a Itália e a Alemanha, quanto à arquitectura, bem entendido, porque nenhum destes dois países conheceu um florescimento de escultura monumental comparável ao nosso pela abundância e pela qualidade.

Itália

A Itália tivera o privilégio de ser um dos lugares de eleição da primeira arte românica; por outro lado, as tradições das basílicas cristãs primitivas tinham-se mantido ali mais vivazes do que em nenhuma outra parte. O primeiro encontro produz-se em Santo Ambrósio de Milão, igreja muitíssimo antiga, mas reconstruída na segunda metade dó século XI e no começo do século XII. O carácter pesado e hesitante das antigas construções desapareceu, cedendo o lugar à majestade especial, ao arejamento da mais antiga concepção basilical, à afirmação segura das linhas, enquanto o átrio acompanha com as suas arcadas uma fachada de largas aberturas. Os pedreiros lombardos não deixa todavia a tradição perder das igrejas de dimensões mais modestas. As de Pavia podem ser citadas como exemplo e particularmente San Pietro in Ciel d’Oro possui uma fachada de maravilhosa harmonia, com a sua larga empena muito simples, aligeirada pelas janelas justapostas que a acompanham. E um motivo vizinho daquele que se encontra muito na Lombardia e que se coloca frequentemente abaixo das faixas lombardas: as galerias de circulação, separadas do exterior por colunelos e arcadas. Muito características são ainda as colunas suportadas por leões. A província de Emília distingue-se com as Catedrais de Modena e de Parma, muito semelhantes aos edifícios lombardos, embora com menos finura, mas Parma tem o mais notável escultor românico, talvez de toda a Itália, Antelarni. Na Venécia, São Zenão de Verona é de grande simplicidade. Na Toscana, a multiplicação das galerias dá uma elegância leve às igrejas de Luca: Catedral, São Frediano ou São Miguel. Mas, antes de tudo, Pisa pode gabar-se dum dos mais soberbos conjuntos arquitectónicos de toda a arte românica, com a Catedral, o Baptistério e o Campanário isolado ou Torre inclinada, que formam um agrupamento ao mesmo tempo frágil e sumptuoso pelo esplendor dos mármores em que são construídos.

Não é em Roma que se deve procurar a grande arquitectura românica: São Clemente tem um ar quase tão arcaico como a encantadora Igreja de Santa Maria in Cosmedin. Um foi reconstruído, a outra restaurada no começo do século xii. Roma deu-nos talvez então as suas obras-primas em pequenos trechos muito cuidados, como os claustros de policromia discreta que serão sempre caros aos espíritos sonhadores, em São João de Latrão ou em São Paulo Extra-Muros.

Por causa do seu carácter predominantemente bizantino, houve que apartar da produção desta época o maravilhoso grupo das igrejas sicilianas. Apresentam belezas mais severas as catedrais românicas da Itália meridional: Amálfi, Tróia, Bitonto ou Bári, não devem de forma alguma ser-lhes sacrificadas.

Alemanha

 A Alemanha otoniana considerou-se mais ou menos legitimamente herdeira de Carlos Magno. A posse da dignidade imperial associava-se para ela às recordações bizantinas, tão vivazes na sua miniatura; e as suas pretensões romanas, manifestadas mais explicitamente por altura da coroação do imperador, punham-na em relações estreitas com a Itália. Ela é riquíssima em igrejas românicas primitivas, como São Miguel de Hildesheim ou Gernrode, basílicas com cobertura de madeira, e, por outro lado, nunca esqueceu o santuário de planta central, o monumento palatino de Aix-la-Chapelle. Foi muito cedo buscar à Itália as faixas lombardas e as galerias exteriores. Por outro lado, mais tardiamente, sofreu em larga escala a influência dos cluni-cienses, que edificaram no seu solo importantes abadias como Hir-sau, e a dos cistercienses a quem se deve em particular a abadia de Maulbronn.

Ela mostrou grande predilecção por uma disposição muito particular da planta, a da dupla ábside que se encontrava já em Saint–Gall e que resolve, suprimindo-o, o problema da fachada, mas que tem o defeito de tornar bastante confusa a orientação por assim dizer espiritual dum edifício alongado. Parece que, em boa lógica, este gosto deveria ter antes dado origem a igrejas de planta central. Tal tendência não se tornou, todavia, muito acentuada senão em Colónia, onde a adopção, nos Santos Apóstolos, duma ábside tri-concheada com uma nave curta cria um modelo, aliás muitíssimo atraente de que esta metrópole não mais se afastará, seja em Santa Maria do Capitólio, seja em São Martinho o Grande.

Embora cidades como Hildesheim, que apresentam ao visitante um conjunto de edifícios românicos quase intactos talvez único no Mundo reservam ao artista alegrias incomparáveis, a glória popular, a glória insigne da Alemanha medieval são as suas catedrais renanas. Sucedem-se, mais ou menos, distantes do rio com os poderosos bispados que coroavam: Basileia, Estrasburgo (que o período gótico inteiramente transformou), Espira, Worms, Mogúncia. As suas dimensões são vastas; frequentemente, adoptam no interior o sistema da alternância do pilar forte e do pilar fraco, de que tiram, porém, conclusões mais lógicas do que os Normandos. E provável que, em 1059 e nos anos seguintes, a Catedral de Espira haja sido recoberta das suas abóbadas de aresta, à razão de uma por cada grupo de dois arcos. Espira deve, aliás, a sua precocidade à afeição particular dos imperadores. Em geral, as grandes catedrais são tardias e a de Worms, inteiramente românica, foi começada numa época em que o estilo gótico estava já com-

pletamente elaborado em França. Isto em nada diminui a sua magnificência, sobretudo no exterior: a multiplicidade das suas torres, as galerias que as aligeiram dão-lhes majestade e pitoresco e ninguém se deve admirar que os Alemães se tenham apegado com tanta tenacidade a esta arte românica que não era sua criação própria mas que tinham recebido com entusiasmo e elaborado com originalidade.

OBRAS CARACTERÍSTICAS

ARQUITECTURA

FRANÇA — Normandia: Jumièges (Ruínas) / Caen (Santo Estevão, Trindade) / Lessay / S. Martin-de-Boscherville (Abadia de São Jorge de B.). — Borgonha: Cluny (Abadia, arruinada) / Paray-le-Montai / Autun / Vézelay / Avallon / Fontenay (Abadia cisterciense). — Poitou e Santonge : Poitiers (Santo Hilário, N.-D.-la-Grande) / Le Dorat / Saintes (São Pedro, Santa Maria das Damas, Santo Eutrópio) / Aulnay / Aifvault / Parthenay-le–Vieux. — Auvergne: Clermont-Ferrand (N.-D.-du-Port) / Mozac (perto de Riom) / Orsival / Issoire / S. Nectaire / Le Puy.— Languedoc : Conques / Tolosa (S. Sernin) / Périgueux (S. Front) / Angolema’ / CaJwrs(estas três últimas com cúpulas). — Provença: Saint-Gilles / Aries (S. Trophime) / Montmajour (Abadia) / S. Paiã–de-Mausole / Saintes-Maries-de-la-Mer / Le Thoronet (Abadia cisterciense). — Loire (escolas diversas): Fontevrault (Abadia, com cúpulas) / Cunault / S. Benoíl-s.-Loire (Abadia) / La Charité-s.–Loire (Abadia) / Nevers (Santo Estevão, tipo do Auvergne).

ESPANHA Ripoll (Abadia) / Santiago de Compostela f Jaca I Salamanea (Antiga Catedral) Zamora / Avila (São Vicente).

PORTUGALCoimbra / Évora / Porto / Braga / Lisboa.

INGLATERRA — S. Albans / Ely / Durham / Petesborough / Gloucester / Norwich j Waltham (Abadia) / Malmessbury (Abadia).

BÉLGICA Journal

ALEMANHAGernrode I Quedlimburgo / Hildesheim (S. Miguel, S. Godehard) / Brunswick / Co/ón/a (Santos Apóstolos, Santa Maria do Capitólio, Santa Ursula, São Martinho o Grande) / Maria Laach (Abadia) / Worms / Espira iMogúncia f Limburgo a. d. Haardt (Ruínas) / Maulbronn (Abadia cisterciense).

SUÉCIALund.

ITALIA — Lombardia: Como (S. Abbondio, S. Fedele) / Milão (Santo Ambrósio) / Chiaravalle (Abadia, perto de Milão) / Pavia (S. Pietro in Ciei d’Oro, S. Miguel). — Emília : Parma / Modena / Placência I Ferrara (Catedral e Abadia de Pomposa). —

Venéza : Verona (S. Zenão). — TOSCANA: Pisa (Catedral, S. Paolo a Ripa d’Arno) / Luca (Catedral, S. Frediano, S. Miguel) / Florença (S. Miniato). — Lácio: Toscanella (São Pedro, Santa Maria Maior) / Roma (São Clemente, Claustros de São João de Latrão, e São Paulo Extra-Muros). — Itália do Sul : Amálfi / Tróia / Bári / Bitonto I Trani / Barletta.

ESCULTURA

FRANÇA — Borgonha : Cluny (Museu Ocher) / Vézelay / Autun (Catedral e Museu) / Chariieu / Neuüly-en-Donjon. — Lan-guedoc: Tolosa (S. Sernin e Museu dos Agostinhos) / Moissac / Conques / Souillac / Beaulieu / Cahors / Angolema / Carennac. — Poitou e Saintonge: Poüiers (N.-D.-la-Grande) / Aulnay / Blasimon / Parthenay-le- Vieicx. / Civray. — Provença : S.-Gilles / Aries (S. Trophime). — Região Parisiense: Chartres (Pórtico Real) / S.-Loup-de-Naud / Paris (Museu dos Monumentos Franceses: Moldagens).

ESPANHASilos (Claustro) / Santiago de Compostela / Leão (Santo Isidoro) / Ripoll / Ávila (São Vicente).

ALEMANHA, ÁUSTRIA — Hildesheim (Catedral: Portas’ Colunas) / Augsburgo (Catedral: Portas) / Klosterneuburgo, perto de Viena (Relicário).

BÉLGICA Liège (São Bartolomeu: Pia baptismal).

RÚSSIA — Novgorod (Catedral: Portas).

ITÁLIA Parma (Catedral e baptistério : Obras de B. Ante-lami) / Modena.

PINTURA MONUMENTAL

FRANÇA — S. Savin-s.-Gartempe / Berzé-la- Ville. ALEMANHA — Prüfening (perto de Ratisbona) / Reichenau (Oberzell, Niederzell).

ESPANHABarcelona (Museu: Reconstituição de capelas).

VITRAIS

FRANÇA Poüiers (Catedral). ALEMANHA — Augsburgo (Catedral).

Tradução de Fernando de Pamplona .Fonte Livraria Tavares Martins, Porto, 1947.

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