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Democratas e socialistas

Inglaterra, Rússia, Áustria e Prússia decidiram pelo tratado de Londres (julho de 1840) opor-se às veleidades imperialistas de Mehe-met Ali, ao qual só reconheciam o Egito hereditário e a Síria a título pessoal e vitalício. O bombardeio de São João d’Acre íêz o velho aventureiro admitir a validade da imposição. Pouco depois, em 1843, as mesmas potências e a França firmavam a convenção dos estreitos, pela qual o sultão reassumiu o direito de fechar os Dardane-los aos navios de guerra de todas as nações, abolindo a exceção dispensada à Rússia. Começava a desenhar-se a rivalidade anglo-russa no Oriente, que durou até há pouco, quando a Alemanha tomou por algum tempo o lugar de ambas no prestígio junto ao governo otomano.

O sufrágio universal e a Assembléia Constituinte

A causa imediata da chamada revolução de fevereiro foi a oposição de Guizot ao projeto de reforma eleitoral, do qual constituía um dos tópicos a incompatibilidade dos empregados públicos para as funções legislativas. Metade quase da Câmara se compunha com efeito de funcionários: os deputados não recebiam subsídio, mas eram indiretamente pagos, bem como seus eleitores, por graças do Estado. A proibição de um dos banquetes de propaganda da reforma, a qual também visava a baixar o censo e conceder o veto a todos os diplomados, ampliando o que se denominava "o país legal", fêz reaparecerem as barricadas. A guarda nacional fraternizou com a oposição e, apesar do apelo do rei para um gabinete da esquerda, a agitação prosseguiu e tomou um caráter francamente republicano. A tropa foi levada de roldão pelo elemento popular, que invadiu a Câmara dos deputados e fêz gorar a regência da duquesa d’Orléans, no nome do conde de Paris, em quem abdicara o avô Luís Filipe, retirando-se para Inglaterra a meio dos combates.

Os intelectuais e propagandistas à frente do movimento e que escalaram o poder constituíam o partido propriamente democrático, o qual se viu entre dois fogos: os reacionários, cujo ardor naturalmente recrudesceu depois de descobertas as baterias avançadas, e os socialistas, que entendiam dever-se esperar um ano antes de convocar os eleitores, para dar tempo à organização republicana ainda não existente. A primeira conquista da revolução fora o sufrágio universal; receando porém que este pudesse trazer muitos realistas à Constituinte, os mais audazes entre os que podemos chamar revolucionários de governo — Blanqui (1805-1881), ateu e libertário que passou longos anos da sua vida nas prisões, e Raspail (1794-1878), por exemplo — pretendiam que se firmasse uma ditadura análoga à da junta de salvação pública. Vingou o alvitre da consulta imediata ao país, reunindo-se a Assembléia Constituinte a 4 de maio, sob uma atmosfera de tempestade.

As oficinas nacionais

Como sempre acontece quando as esperanças concebidas se não podem concretizar, o descontentamento entre as classes trabalhadoras foi grande, tanto mais quanto o momento era de crise agrícola e industrial, agravada pela desconfiança da burguesia. Para dar que fazer aos operários, o governo provisório, inspirado neste ponto por Louis Blanc (1811-1882), imaginou as "oficinas nacionais". O ministro do comércio não as organizou porém seriamente e os desocupados, que subiram logo a mais de 100 000, foram em bom número empregados em fazer aterros desnecessários, com um salário irrisório de 1 franco e 50 cêntimos, o que ainda assim representava um ônus para o Estado de 150 000 francos diários, que recaiu como um gravame sobre o contribuinte na forma de um imposto suplementar às taxas diretas, de 45 cêntimos por franco, descontentando sobretudo a gente do campo, aferrada ao dinheiro e que tinha saudado a república e o sufrágio universal com tocante entusiasmo, plantando nas aldeias árvores da liberdade sob as bênçãos do clero, e acompanhando com tochas acesas a urna eleitoral para o lugar do escrutínio, venerando-a, nas palavras de um autor, como um tabernáculo sagrado.

Os dias de Junho

Foi a clausura das "oficinas nacionais" a causa direta e imediata das célebres journées de juin. Derrotados para mais nas eleições, os revolucionários socialistas sentiram-se desprotegidos, recorreram às armas e ensangüentaram Paris. Foram três dias de combates encarniçados entre 50 000 insurgentes e as tropas do general Cavaignac, dos quais resultaram 16 000 mortos e feridos. A questão operária foi assim bruscamente liquidada pelos mandatários de um corpo eleitoral que era conservador pelo próprio interesse. Quatro mil operários agarrados com as armas na mão viram-se condenados à deportação. O estado de sítio prolongou-se, Cavaignac concentrou nas suas mãos os poderes e a constituição elaborada sob essa pressão moral criou virtualmente a ditadura.

A Constituição de 1848 e a propriedade

A Constituição de 12 de novembro de 1848, que aboliu a escravidão negra nas colônias francesas e a censura da imprensa, recomendava a igualdade das relações entre patrão e obreiro e o desenvolvimento das instituições de previdência e de crédito — o mutualismo fora uma das preocupações de Proudhon, — bem como uma assistência fraternal, não porém o direito ao trabalho, que a Assembléia rejeitara. Tais votos foram entretanto platônicos, visto que o problema imediato era o da manutenção da ordem pública e da propriedade, a qual figurava juntamente com a família e o trabalho entre "os direitos e deveres anteriores e superiores às leis positivas". O trabalho contudo entendia-se no sentido de ser obtido na medida do possível para os que dele careciam: aos inválidos devia-se dispensar proteção.

O regime residencial francês

Os republicanos moderados, que constituíam a maioria da Assembléia de 900 membros eleitos por departamentos, inspiraram-se do modelo americano para entregar o poder executivo a um presidente eleito para um período de 4 anos por voto direto do povo e pelo sufrágio universal, competindo-lhe escolher seus ministros, os quais não eram responsáveis para com a câmara única, que elaborava o orçamento e as leis e não podia ser dissolvida, da mesma forma que o presidente não podia ser reeleito. De fato este era irresponsável, porque qualquer voto da assembléia contra êle não implicava conseqüência alguma, faltando-lhe portanto sanção. Sua responsabilidade era tão-sòmente para com o povo, o qual nele delegava sua soberania, porquanto a república era democrática, se bem que "autoridade e força" estivessem nas mãos do representante supremo da nação.

A eleição de Luís Napoleão

Na eleição de 10 de dezembro, Luís Napoleão Bonaparte reuniu 5 1/2 milhões, cabendo os restantes a Cavaignac e Ledru-Rollin. Filho do antigo rei da Holanda e de Hortênsia, filha de Josefina de Beau-harnais, fora educado na Suíça, filiara-se como carbonário na Itália e promovera durante o reinado de Luís Filipe dois pronunciamentos bonapartistas: um em Estrasburgo em 1836 e outro em Boulogne em 1840, desta vez com 50 amigos e uma águia domesticada. Preso e encarcerado na fortaleza de Ham, conseguira evadir-se disfarçado em trabalhador. Eleito à Constituinte, tornou-se o alvo da atenção do país. A auréola napoleónico circundava-lhe a fronte; o exército nele via o sucessor do "petit tondu"; as classes conservadoras estavam sequiosas de ordem: tudo conspirava em seu favor.

Fonte: Melhoramentos

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