A CIVILIZAÇÃO HELÊNICA

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História da Civilização – Oliveira Lima

IDADE ANTIGA

CAPÍTULO II

A CIVILIZAÇÃO HELÉNICA

O valor da civilização grega

O tamanho do país não está neste caso em relação com a grandeza da civilização a que serviu de berço, a mais completa da antiguidade, a que maior número de idéias aventou, discutiu e disseminou, a ponto tal que ainda hoje se vai buscar no seu vocabulario a terminologia científica e filosófica e que, sob certos aspectos, jamais foram excedidas as manifestações do gênio helénico. A disposição geográfica fazia da península grega o cenário adequado dessa surpreendente atividade mental e social que brilhou radiosamente na poesia, no teatro e na eloqüência, erigiu o civismo em culto popular e elevou a política a uma arte para competentes.

Aspectos físicos e tradições da civilização grega

A Grécia é uma terra alterosa, cortada de vales, defendida por desfiladeiros, assim repelindo a tutela de invasores, com uma costa de mil anfractuosidades, como que chamando às suas enseadas calmas a colaboração estrangeira. Esta desde começo que lhe não faltou, pois segundo suas tradições fabulosas, foi o fenício Cadmo quem ensinou aos gregos o alfabeto e a arte de trabalhar os metais e quem construiu na Beócia a cidadela de Tebas, e foi o egípcio Cécrops quem, com seus companheiros, encetou a construção da Acrópole de Atenas, instituiu o tribunal do areópago e implantou na Ática o cultivo da vinha e da oliveira. Outro egípcio, Danaus, ensinou aos habitantes de Argos a arte da navegação, a qual tão bem aprenderam que os argonautas, sob o comando de Jasão, foram combater os piratas da Cólquida e franquear ao comércio grego o Ponto Euxino, de lá trazendo o velocino de ouro, símbolo da riqueza mercantil.

O período heróico da Grécia Antiga

Essas tradições fabulosas repousam sobre um fundo de realidade, referindo-se as citadas ao primitivo intercurso dos gregos com povos então mais adiantados. A história grega apenas começa no século VIII a. C, mas o período anterior, legendário e heróico, deve haver sido prolongado porque, ao começar o período histórico, já a língua grega estava perfeitamente formada e a sua mitologia aparecia tal como a conhecemos, imaginativa e risonha.

As cidades e os clãs dos gregos

Isoladas nos vales estreitos ficavam cidades de característicos diferentes, cidades-estados, às vezes compostas da cidade exclusivamente, outras vezes abraçando* as aldeias circunvizinhas. Tinham-nas fundado tribos de índole altiva, que tratavam de desenvolver seus destinos numa ciosa independência. Formava cada tribo diversos clãs, sendo o clã a família ampliada, ligada por laços de parentesco e de religião, tendo o culto do mesmo antepassado comum.

A península grega

País montanhoso e marítimo, com seus núcleos políticos a um tempo divididos entre si pelo espírito local e com a vastidão das águas a convidá-los a empresas remuneradoras, compõe-se a península grega de duas partes proporcionais — a Hélade ao norte e o Pelo-poneso ou Moréia ao sul, quase separadas as duas metades pelo Golfo de Corinto, hoje completado pelo canal, onde havia o istmo.

Os mentes Cambúnios como que resguardam a Grécia, na frase de um historiador, dos ventos frios e das tribos hostis da Macedónia. A nordeste da vasta planície da Tessália ergue-se o Monte Olimpo, cujo cume, coroado de nuvens, a 3 000 metros de altura, serve de morada ao Panteão do politeísmo helénico, personificando as forças da natureza. Descendo para o sul, ainda do lado do Mar Egeu, levantam-se como sentinelas os montes Ossa e Pelion, que os titãs da fábula colocaram um sobre o outro para escalar o céu quando moveram guerra aos deuses. Do lado do oeste a cadeia do Pindo separa a Tessália do Epiro e vai constituir o sistema orográfico da Hélade. Da planície da Tessália prolongada pela Etólia se desprende uma espécie de grande língua de terra arrendada, que é propriamente a Grécia central, onde mais ativa pulsou a civilização.

As montanhas dessa região são mais baixas e nemorosas, regan-do-as fontes abundantes. Aí habitavam as Musas, no Parnaso e no Helicon; mais para o meio-dia, perto donde floresceu o aticismo, avultam o Himeto, em cuja encosta flui o mel, e o Pentélico, célebre pelos seus mármores. A Arcádia forma no Peloponeso o planalto central fechado por montanhas; a simplicidade pastoril dos seus habitantes, por assim dizer isolados do movimento intelectual que agitou a Grécia, ficou proverbial. Projetando-se no Mar Egeu, a Ar-gólida recorda ter sido a sede de uma cultura pré-histórica. No sul, a Lacônia ou Lacedemônia encerra o vale profundo do Eurotas, onde se aninhou a cultura espartana: os rios na Grécia são antes torrentes de inverno. A oeste fica a Elida, onde se verificavam os jogos olímpicos, que tão belos modelos vivos ofereciam à estatuária grega, a qual por essa forma animavam.

O Mar Egeu

Coalhado de ilhas, o Mar Egeu apresentava fácil e já experimentada passagem aos que, de gênio mais aventuroso, se sentissem abafados dentro dos confins da sua pequenina pátria e atraídos pela costa fronteira da Ásia Menor a fundarem ali colônias e espalharem sua cultura compreensiva e sutil. A Grécia faz frente à Ásia, pois que seus mais abundantes e melhores portos se acham na costa oriental, da mesma forma que a Itália faz frente à Espanha, pois que seus mais abundantes e melhores portos ficam na costa ocidental.

Os grupos de populações. As culturas jónica e dórica

Os habitantes da Grécia intitulavam-se helenos e dividiam-se em quatro grupos — jônios, dórios, aqueus, que dominaram o Peloponeso em tempos pré-históricos e predominaram entre as tribos gregas, e eólios, dos quais se pode dizer um tanto vagamente que são os que não pertencem a nenhuma das outras divisões. Na Hélade floresceu por excelência a civilização jónica e no Peloponeso a civilização dórica, representadas uma por Atenas e outra por Esparta, sem que isso signifique que cada um desses centros absorvesse os demais, apenas que num dado momento impôs sua hegemonia — o vocábulo é grego — a uma liga de cidades livres, entre as quais aquele foco brilhava excepcionalmente. A cultura jónica significou mais espírito cosmopolita, maior largueza de vistas, mais graça de expressão, maior mobilidade intelectual; a dórica mais espírito nacionalista, mais estreiteza de concepções, mais rigidez de costumes, menos horizontes mentais.

As ilhas e a costa da Ásia Menor

Todos os helenos, descendentes de Prometeu segundo a própria crença, vieram da Ásia: os jônios por mar, através do mundo de ilhas do Egeu, os dorios tangendo seus rebanhos de pasto em pasto desde o Egito, com um pouso mais prolongado na Dórida. Os jônios desceram até a Ática; os dórios introduziram a desordem no Peloponeso, provocando o êxodo de várias tribos para a Ásia Menor; os eólios fixaram-se no centro e a oeste da península) Foi em virtude dessas deslocações de tribos que os jônios, tomando rumo por entre as Cíclades que rodeavam o santuário famoso de Apolo em Délos, fundaram Éfeso e Mileto no litoral fronteiro, dando origem à Jônia, e que os dorios, acompanhando esses movimentos de população, ocuparam Creta, alcançaram Rodes (colónia fundada por fenícios) e chegaram a Halicarnasso, na extremidade meridional da costa asiática fronteira à Hélade.

Essa costa e as ilhas que a guarnecem de perto foram teatro de uma cultura notável que precedeu mesmo a helénica e da qual são representativas a poetisa Safo, de Lesbos, que foi colónia eólia, o matemático Tales, de Mileto, que sabia calcular os eclipses, e o filósofo Pitágoras, de Samos, que precedeu Galileu na teoria do movimento da terra. Na península a civilização helénica sucedeu a outra que é chamada pelásgica, que nem por isso é menos obscura e de que entretanto há traços, entre outros lugares, nos muros ciclópicos de Corinto, de Micenas e de Tróia.

Odisseu e Nausícaa. Odisseia, canto VI. Pintura de um vaso. Séc. V a. C.
Odisseu e Nausícaa. Odisseia, canto VI. Pintura de um vaso. Séc. V a. C.
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