O QUE A MARATONA NOS ENSINA

jun 2nd, 2005 | Por | Categoria: Esportes        

Nei Duclós

Nosso maratonista Vanderlei Cordeiro de Lima não era para estar lá, naquela posição, liderando a mais importante prova das Olimpíadas de Atenas. O jornalismo brasileiro não o tinha escolhido, portanto não merecia contrariar a pauta. O terrorista que impediu sua vitória (usando vestidinho plissé magenta) apenas completou o serviço da exclusão e o colocou à força no terceiro lugar.O jornalismo só pode fazer História quando fizer realmente jornalismo, e não quando pretender ser testemunha ocular da História. A História não se revela a olho nu, não é algo que caia nas redes de televisão.

ESTUDO
– É preciso aprender, antes de tudo, metodologia. A que mais me toca é a de Sérgio Buarque de Hollanda, que não contente em nos presentear com seu filho Chico ainda tem uma obra que precisa ser lida inteira. O que faz o grande historiador? Encarna o documento e compõe a História nas águas da linguagem que estuda e consulta. É um trabalho de cão (para mais de uma vida, dizia ele), que fez de Visões do Paraíso a mais importante obra da erudição nacional. Fazer História não é berrar patriotadas diante dos jogos. Cadê a reportagem? o­nde estava nosso maratonista antes de ser atacado pela falha gritante da segurança, tão incensada pelo telejornalismo brasileiro? Porque foi isso o que aconteceu: gastaram bilhões em esquemas pirotécnicos de segurança e deixaram escapar o imponderável, o louco, que estava vestido exatamente igual ao dia em que interrompeu a Fórmula Um. Nada viram e deixaram que impedisse nosso querido maratonista de fechar as Olimpíadas com o Hino Nacional do Brasil soberano. Ao deixarem de lado Vanderlei (era só vôlei,vôlei,vôlei), o jornalismo brasileiro comeu a maior mosca da História.

PERDÃO
– Vanderlei sentiu pânico, sentiu medo de morrer. Depois, desconcentrado, exausto, sai abrindo os braços pedindo providências, reclamando da injustiça. Entrou no estádio como um verdadeiro herói, o maior atleta destas Olimpíadas. E a tudo perdoou porque essa é natureza do Brasil soberano, o país que tem consolidada sua soberania e por isso está deitado eternamente em berço esplêndido (que significa exatamente isso, a consolidação de suas fronteiras, a segurança de estar garantido como nação, pelo menos quando o Hino foi feito). Vanderlei ficou feliz com o bronze, com a medalha especial e passou por cima do ouro que lhe negaram. Esse bronze e essa medalha especial suplantaram todos os ouros das grandes potências esportivas. É um gesto de grandeza, de perdão, de quem está por cima, de quem nasceu no berço de um grande país, hoje descosturado, mas tendo intacta ainda sua vocação para a maioridade. Vamos aprender com a maratona e seu herói: surpreenda quem o colocou numa gavetinha qualquer, supere-se, e se o imprevisto arrastá-lo para fora do seu destino, perdoe, porque perdoar é livrar-se do Mal e criar uma nova chance.

Deixar comentário