ESCREVER É PRECISO
fev 9th, 2011 | Por Nei Duclós | Categoria: Redação sem MáscaraNei Duclós
Navegar obedece à técnica. Viver é diferente, é algo vago, confuso.
Astrolábio, sextante, sonar, bússola: navegar é uma atividade de alta precisão. Navegar é preciso.
Amar, sofrer, sonhar, decidir, arrepender-se: viver é uma atividade cheia de imprecisões. Viver não é preciso
Escrever não é viver, é navegar: existem instrumentos precisos para seu uso e orientação. Isso não significa que seja uma ação fechada em si mesma
O que falamos é preciso. O que os outros falam é impreciso
A frase pelo avesso, a provocação, não pode ser perseguida a paulada pela ilusão corretiva. Deve haver margem para o espírito livre
A palavra busca as próprias raízes para subverter as manipulações. Navega na precisão, mas não no engessamento do seu significado
Assim como os cálculos levam o navio para terras ignotas, escrever também palmilha o desconhecido.
Você não se atira no mar sem saber o mínimo de como agir entre as ondas e o oceano profundo.
Também não deve se aventurar na escrita sem que haja o mínimo de conhecimento
Navegar, como escrever, se aprende. Não é uma atividade que brote, como respirar, comer, suar.
Não que haja necessidade de escritores, assim como não há necessidade de navegadores.
As duas ações inventam suas próprias necessidades e desdobramentos.
A humanidade poderia ter ficado em terra e qualquer pessoa pode se dar ao luxo de jamais rabiscar uma frase.
Escrever, portanto, é preciso, mas não necessário. Como navegar. E viver é absolutamente impreciso, mas fundamental. Sem vida não há prosa ou verso.
Mas tanto escrever quanto navegar estão sob a guarda de uma imprecisão: a vocação.
O chamamento (vocare) se manifesta cedo, mas nem sempre significa destino. É mais uma indicação.
A não ser que Deus em pessoa tenha interferido na invenção da criatura.
Repassar o encargo é comum nas longas férias do Sétimo Dia
O gênio nasce quando Deus não terceiriza a Criação.
O poema se manifesta de todas as formas. Não use pedras da lógica ferrada para contestar o que o poesia afirma, inspirada pela lucidez em forma de devoção