Os Atos Humanos – Curso de Filosofia de Jolivet

Curso de Filosofia – Régis Jolivet

Capítulo Quarto

OS ATOS HUMANOS

 

267        Até aqui
consideramos apenas os princípios extrínsecos da moralidade, isto é, os
que determinaram de fora, a saber, o fim último e a lei. Estudaremos, agora,
os princípios intrínsecos, isto é, interiores ao sujeito da lei, ou
agente moral. Estes princípios são, de um lado, a vontade livre, que é a
condição necessária dos atos humanos (por conseguinte, dos atos morais) — de outro lado, aqueles de que dependem a moralidade objetiva (ditame
da razão prática)
e a moral subjetiva {consciência moral), — enfim,
os princípios (responsabilidade, mérito, demérito, sanção, virtudes e
vícios)
que compõem as propriedades e as conseqüências dos atos humanos.

Art.
I. O ATO HUMANO ENQUANTO VOLUNTÁRIO

268        Os atos
humanos não podem ser atos morais a não ser que procedam da vontade livre. Seu
grau de valor moral dependerá, pois. do grau de liberdade com que forem
realizados.

§   1.      CONDIÇÕES DO ATO VOLUNTÁRIO

Um ato não pode ser
chamado voluntário senão nas seguintes condições:

1.      
Deve ser espontâneo, isto é,
proceder de uma tendência própria e interior à vontade, senão é coagido e
forçado.

2.      
O fim deve ser conhecido como tal,
senão o ato não é voluntário, mas natural ou instintivo, pois procede de um
princípio interior cego, como é o caso da atividade vegetal ou animal.

§  2.      DIVISÕES DO ATO VOLUNTÁRIO

O ato voluntário pode ser:

1.    Necessário ou livre,
conforme a vontade possa ou não realizá-lo. Vimos acima que a busca da
felicidade é um ato de vontade necessário.

Quando dizemos atos
humanos,
designamos sempre atos de vontade livre.

2.      
Elícito ou imputado, conforme
proceda diretamente da vontade (amar, desejar) ou duma faculdade movida {ou
"imputada")
pela vontade (ver, pensar, escutar).

3.      
Direto ou indireto, conforme a
vontade o realize por si mesma ou como efeito previsto de um ato
desejado por si mesmo. Por exemplo, em caso de guerra, um aviador que deseje
destruir uma fábrica de armamentos (voluntário direto) prevê que o bombardeio
causará a destruição de casas particulares próximas das fábricas (voluntário
indireto).

§   3.      GRAUS DA VOLIÇÃO

269        O grau do ato voluntário livre
é proporcional ao grau de espontaneidade do ato realizado e ao grau de
conhecimento do fim.

1. As causas que podem agir
sobre a vontade paia diminuir ou anular a sua espontaneidade são as
seguintes:

a)     A paixão, quer
dizer, a atração violenta para um bem sensível. A paixão que anteceda ao
ato voluntário diminui ou suprime o uso da razão e, por conseguinte, a
responsabilidade. A paixão que se segue ao ato voluntário, estando
alimentada por um propósito deliberado, aumenta a responsabilidade.

À paixão, podemos acrescentar
as propensões naturais, que resultam do temperamento: elas não
suprimem, de ordinário, o livre-arbítrio, mas podem mais ou menos diminuí-lo.

b)     O medo, ou
perturbação mental provocada por um mal iminente. Pode ser superficial ou
grave. Superficial, não suprime, mas diminui o livre-arbítrio; grave, pode chegar a suprimir a liberdade, desde que paralise a razão.

 

c) A violência, ou
força exterior que obriga a realizar um ato que repugna a vontade. A violência
não pode coagir a vontade, que, por ser interior, escapa-lhe absolutamente. Mas
pode agir sobre os atos exteriores pelos quais a vontade se exprime, para produzi-los
ou impedi-los. É isto que faziam os magistrados pagãos, que forçavam os
cristãos, por coação física, a oferecer incenso aos falsos deuses. Estes atos
de coação devem ser chamados involuntários, na medida mesma em que a vontade
deixe de neles colaborar.

2. As causas que agem
sobre a inteligência, para diminuir ou suprimir o conhecimento de um fim, são
os diversos tipos de ignorância. A ignorância pode ser vencível ou
invencível.
A primeira torna o ato indiretamente voluntário, porque a
negligência de tomar informações, sendo voluntária e culpável, supõe a aceitação
das conseqüências da ignorância. Não pode, portanto, enganar-se pensando
escapar às responsabilidades de seus atos, evitando sistematicamente
esclarecer-se  sobre os seus  deveres.

A ignorância invencível é
atualmente
involuntária: por conseguinte:
ela não é culpável.

ART. II.     O ATO HUMANO COMO ATO MORAL

270       Os atos humanos não se
manifestam apenas à nossa consciência como voluntários e livres, mas ainda
como morais, quer dizer, como possuindo uma propriedade que os faz bons
ou maus. Esta propriedade dos atos humanos se apresenta como sendo a um tempo objetiva
(ou material),
quer dizer, como qualificando o ato em si mesmo, que será
objetivamente bom ou mau conforme esteja ou não de acordo com a lei moral, — e
subjetiva (ou formal),
quer dizer, como qualificando o ato, não mais em si
mesmo, mas enquanto proceda da vontade livre e tornando-o subjetivamente bom
ou mau conforme a retidão ou a falta de retidão da vontade.

§   1.      A   MORALIDADE  OBJETIVA

Nosso estudo do fim
último e da lei moral nos mostrou que o bem e o mal, no ato humano, serão
definidos objetivamente, pela conveniência ou  não-conveniência deste
ato  com o fim último do homem. Mas como
esta conveniência ou esta não-conveniência devem ser conhecidas pela razão
humana, dizemos que a regra imediata do bem e do mal reside no acordo ou no
desacordo dos atos morais com a razão humana.

1.    O bem honesto. —
Do ponto-de-vista moral, um objeto é bom ou mau em si mesmo, conforme esteja ou
não proporcionado à obtenção do fim último do homem (251). É, por conseguinte,
não no seu ser físico que ele deverá ser julgado aqui, mas no seu ser moral, constituído pela conformidade ou não-conformidade do ato (ou do objeto a
que está ordenado e que o especifica moralmente, quer dizer: dá-lhe sua
qualidade moral) com o fim último do homem.

É esta conformidade ou esta
proporção do ato humano com o fim último que define propriamente o bem
honesto
na sua essência objetiva. Donde, podemos dizer que a moralidade
objetiva resultará dos objetos ou fins imediatos da ação conforme estes fins
(ou estes objetos) sejam ou não bens honestos,
quer dizer, desejáveis em
si mesmos e convenientes ao homem.

2.    A razão prática.

a)     O ditame da
razão.
À lei natural, como já dissemos, não importa senão princípios muito
gerais. É necessário constante
mente, na prática, fazer aplicação destes princípios aos casos concretos. Esta
aplicação se faz por meio de um silogismo (a maior parte do tempo,
implícito), cuja maior formula o princípio geral do direito natural, a menor
define ou qualifica o ato concreto em. questão, e a conclusão pronuncia um juízo
prático moral, que constitui o ditame ou sentença da razão.

Exemplo: é necessário respeitar a palavra
dada. Ora. eu dei a Pedro a minha palavra de ajudá-lo com meu dinheiro. Devo,
então, dar-lhe a soma de dinheiro de que ele necessita. — é necessário não
cometer a injustiça. Ora, o ato de caluniar alguém seria uma injustiça. Logo,
devo evitar este ato.

b)     A ordem da
reta razão.
É a sentença que corresponde realmente, no caso
concreto (por conseguinte, em vista das circunstâncias), às exigências
objetivas da moralidade.
É esta sentença que constitui a regra próxima
da moralidade objetiva
(pois a regra suprema é a lei eterna).

3.    Elementos da
moralidade objetiva. — Estes elementos são: o objeto, as circunstâncias e o
fim.

a)         O objeto. O objeto moral é a coisa que o ato realizo, diretamente
por si mesmo,
enquanto esta coisa é conhecida pela razão como conforme ou
não à lei moral. Assim, a esmola, considerada como visando a auxiliar os
desgraçados, é uma coisa moralmente boa. É este objeto que constitui a fonte
primeira da moralidade.

b)         As circunstâncias. Entende-se por circunstâncias todos os elementos
acidentais do ato.
Quando as circunstâncias são puros acidentes, quer
dizer, quando são independentes da situação do agente, não são capazes de
especificar o ato moral. Ao contrário, quando implicam numa intenção
especial do agente,
seja por, seja contra a ordem da razão, e são desejadas por si mesmas, as circunstâncias especificam o ato e podem mudar-lhe a natureza. Elas são, conforme o caso, agravantes (roubar um pobre) ou atenuantes
(roubar para alimentar os filhos na miséria).

c)        
O fim. O fim de que falamos
aqui é o fim subjetivo ou intenção, quer dizer, o fim que se propõe o
agente moral na sua ação. Este fim subjetivo pode não coincidir com o fim
objetivo:
assim, pode-se dar esmola por uma outra razão que não o amparo
dos desgraçados (que é o fim objetivo da esmola e o que lhe dá sua existência
moral), por exemplo, por pura vaidade. — Vê-se assim que o valor moral dos atos
lhes vem materialmente do objeto do ato exterior e formalmente do
fim ou da intenção de que procedem.

4.    O ato concreto.
— Do que precede resulta que um ato concreto não será mortalmente bom se não
estiver conforme em todos os seus elementos, objeto, intenção e circunstâncias,
à regra da moralidade.
—. Talvez se imagine que isto não esteja bem de
acordo com a primazia da intenção. Mas isto seria esquecer que a intenção se
refere ao ato por inteiro, e, por conseguinte, que ela não pode continuar boa,
se o objeto e as circunstâncias tiverem alguma coisa de essencialmente mau. A
intenção, que se aplica acima de tudo ao fim, não pode fazer abstração dos
meios de que se utiliza.
O fim nem sempre é suficiente para justificar
estes meios: ele justifica os meios indiferentes em si mesmos, mas não os atos
intrinsecamente maus. É o que quer dizer o
adágio: "O fim não justifica os meios", quer dizer que jamais se
permite fazer o mal para obter o bem.

§   2.     A  MORALIDADE   SUBJETIVA

271 A moralidade subjetiva é a que qualifica (ou
especifica) o ato enquanto precisamente ele procede da consciência moral. É
com efeito, a consciência, como regra imediata e universal da conduta, que
determina, a cada um em particular, a qualidade moral de seus atos. O estudo da
moralidade subjetiva é, então, propriamente, o da consciência moral.

      1.   Natureza da consciência moral. — Para falar
com exatidão,

a consciência moral não é uma faculdade, mas um ato, a
saber, o juízo que temos da moralidade de nossos atos e pelo qual decidimos
em última análise o que se deve fazer ou não.
Como tal, a consciência moral
se exprime da conclusão do silogismo moral; ela é o último juízo prático, quer
dizer, aquele que determina imediatamente a ação do ponto-de-vista moral.

A consciência consiste então,
essencialmente, na apreciação de nossa própria conduta; ela testemunha que nós
fazemos, fizemos ou vamos fazer bem ou mal em tal caso dado; ela nos obriga ou
desobriga, aprova, desculpa  ou censura.

2.    Valor da
consciência moral. — Na apreciação deste valor, é necessário resguardar-se de
um duplo erro que seria, de uma parte, ter como infalíveis todas as injunções
da consciência moral e, de outra parte, recusar-lhe sistematicamente toda
autoridade.

a)         A consciência moral não é
infalível,
fora de seus primeiros
princípios universais. É o que a experiência de cada dia nos mostra muito bem,
e o que quer remediar a casuística, determinando o dever e o direito
nos casos complexos da vida moral.

b)         A consciência moral não é
desprovida de todo valor,
pois jamais
variou sobre os princípios fundamentais da moralidade: neste domínio, seu valor
é absoluto. Suas variações e suas contradições não existem senão no domínio
das aplicações aos casos particulares  da vida moral:  estas 
aplicações  podem   ser   defeituosas devido a circunstâncias exteriores (grau
de civilização, tradições, condições de existência etc), mas, por mais
defeituosas que sejam, elas se referem sempre aos grandes princípios
universais da moralidade (256) e podem ser corrigidas pela formação da consciência.

3.    Divisão. — A consciência moral é:

a)         Reta ou falsa, conforme o juízo que tenha seja conforme ou não à
moralidade objetiva, quer dizer, à lei natural e à lei eterna.

b)         Certa ou duvidosa, conforme o juízo que tenha seja pronunciado sem risco
de erro ou sobre uma simples probabilidade.

272      4.    Formação  da consciência moral.

a)          Caso da consciência certa,. Agimos sempre honestamente quando temos uma
consciência certa de ser lícito o ato a realizar. Para ter uma consciência legitimamente certa é necessário formar a sua consciência pela reflexão, pelo estudo da
Moral, pela consulta a pessoas competentes e sábias, e sobretudo pela prática
habitual das virtudes morais.

b)          Caso da consciência duvidosa. Quando, após ter refletido e, se for possível,
consultado pessoas competentes, a consciência fica em dúvida sobre a
legitimidade de um ato, pode-se, segundo alguns, realizar o ato, se existe
apenas uma probabilidade a seu favor (probabilismo), — segundo outros,
não se pode realizá-lo a não ser que haja para ele uma probabilidade maior que
a negativa (probabilismo), enfim, segundo outros, é necessário sempre escolher
o partido mais seguro e mais confortável à lei (tutorismo).

O primeiro sistema nos parece mais verdadeiro. Se,
com efeito, existe dúvida no tocante, quer à existência da lei, quer à sua,
aplicação, tudo se passa como se a lei não existisse.
Somos, então, livres,
de agir num ou noutro sentido. — Notemos, contudo, que, para usar desta
liberdade, será necessário sempre um motivo razoável, porque nenhum ato
moral se justifica pelo único fato de que não foi proibido: é necessário,
então, que haja ainda um objeto conforme ao fim dos atos humanos, a saber, o
bem moral. —  Notemos, também, que quando este ato pode fazer correr graves
perigos, físicos ou morais, ao próximo ou a si mesmo, a caridade para com outro
ou para consigo poderá exigir que se renuncie ao ato. Neste caso se aplica o
princípio: necessário tomar o partido mais seguro".

ART. III.    CONSEQÜÊNCIAS DOS ATOS MORAIS

273 Como os atos
morais são, por essência, atos livres, quer dizer, atos nossos, desejados por
nós, segue-se daí que assumimos a sua responsabilidade, que eles se
tornam para nós causas de mérito ou demérito e que exigem sanções
apropriadas.
Além disso, a atividade moral gera hábitos, bons ou maus, que
se chamam virtudes e vícios,

§   1.      A RESPONSABILIDADE

1.    Noção.

a)         A responsabilidade. Como o nome indica, a responsabilidade é a obrigação
em que se encontra o agente moral de ”responder", por seus atos,
quer
dizer, de sofrer-lhes as conseqüências.

b)         A imputabilidade. A responsabilidade supõe a imputabilidade, que é a propriedade
em virtude da qual um ato pode com plena justiça, ser atribuído a uma pessoa
como sua autora.
O ato de violência imposto a um homem a quem se torce o
braço à força não lhe é imputável. Ele não é, portanto, responsável.

2.    Espécies. — Distinguem-se:

a)         A responsabilidade moral: é a responsabilidade em que incorremos ante nossa
consciência
e, por conseguinte, ante Deus. Esta responsabilidade afeta
todos os nossos atos morais, interiores e exteriores, públicos e privados, e
até as simples intenções.

b)         A responsabilidade social: é a responsabilidade em que incorremos ante as
autoridades sociais, em
conseqüência das infrações às leis civis. A
responsabilidade civil não se aplica senão aos atos exteriores, pois a
intimidade da consciência não é conhecida senão por Deus.

Existe ainda um outro
tipo de responsabilidade social, que resulta da influência, boa ou má, que
exercemos em torno de nós, por nossos atos,

§   2.      MÉRITO E DEMÉRITO

274      1.   Noção. — A noção de mérito é complexa.  
Ela evoca:

a)          O direito à sanção, recompensa ou punição, conforme o ato moral seja bom
ou mau.

b)         
O valor moral do ato ou
daquele que o executa. Diz-se, com efeito, ora que tal ato é meritório, ora que
alguém é uma pessoa de mérito. É no sentido de valor moral que tomamos
aqui a noção de mérito, de vez que o primeiro sentido se confunde com a idéia
de sanção, que estudaremos mais adiante.

2. Condições de
méritos nos atos. — O valor meritório de um ato moral depende de vários
fatores:

a)         Da gravidade dos deveres. Quanto mais importância tenha o dever a cumprir,
maior é o mérito do ato conforme ao dever. Existe mais mérito em respeitar seus
pais do que ser polido com os desconhecidos, maior demérito em faltar a um
dever de justiça, do que faltar a um dever impreciso de caridade.

b)         Das dificuldades a vencer. O dever que impõe pesados sacrifícios é fonte de
maior mérito do que o mesmo dever realizado sem dificuldade, e existe mais
mérito em fazer bem aos inimigos do que em servir aos amigos.

Todavia, não se deve chegar a supor, como
Kant, que o esforço é essencial
ao mérito e que a satisfação na realização do dever suprime o mérito. Eis um
grave erro. A satisfação no dever e no sacrifício é sinal de um grande
domínio das paixões
e de um verdadeiro hábito do bem, coisas que não são
realizadas sem luta obstinada. Na realidade, o esforço e a dificuldade não são
fontes de mérito senão acidentalmente, quer dizer, enquanto são ocasião
e sinal de uma vontade mais ardente do bem.

c)     Da pureza de
intenção.
Quanto mais a intenção for pura, mais o mérito será grande. Há
maior mérito em servir aos amigos por
pura cordialidade do que pelo interesse de ser tratado da mesma forma quando
chegar a ocasião.

§ 3.    A sanção

275 1. Noção. — A sanção
nasce, como vimos, de responsabilidade, e é, no seu sentido mais geral, a recompensa
ou o castigo exigidos pela observância ou violação do dever.

2.    Espécies. — Distinguem-se as sanções  terrestres
e a sanção da vida futura. As principais sanções terrestres são: a sanção
da consciência,
que é a satisfação ou o desgosto  (arrependimento,
vergonha, remorso)  que resultam, na consciência, da observância ou violação
das leis morais, — a opinião pública,  que  estima as pessoas honestas e
lança ao desprezo os iníquos, — as conseqüências naturais de nossos atos: o
alcoólatra sofre uma decadência física e transmite esta decadência a seu
descendente — as sanções-civis, que a sociedade civil inflige aos
contraventores da lei   (multas, prisão, pena de morte).

276     
3.    Necessidade da sanção na vida futura.

a)    Insuficiência das sanções terrestres. As
sanções terrestres, quer tomadas separadamente quer em conjunto, aparecem como
insuficientes.  A sanção da consciência seria  mais  pesada para as
almas escrupulosas  do que para os  criminosos endurecidos. — A opinião
pública
é caprichosa, injusta e de alcance muito limitado.. — A
sociedade
não atinge senão os atos exteriores e está bem longe de sancionar
todos os crimes que se cometem. Ela está, por outro lado, grandemente sujeita
ao erro. Enfim, se ela pune, não recompensa, ou, se recompensa, é
insuficiente, e por um julgamento exterior. — Quanto às conseqüências
naturais
dos atos morais, elas atingem muitas vezes   (pela
hereditariedade)   aqueles que não são os autores do mal.

b) As exigências da
justiça.
A justiça exige que o bem seja recompensado e o mal punido. Ora,
isto não pode realizar-se senão pela sanção da vida futura. Somente
esta pode ser rigorosamente justa, uma vez que depende de Deus, que
"sonda os rins e os corações", — realmente eficaz, porque
ninguém pode escapar-lhe.

Nenhum subterfúgio
daquele que é culpado, nenhum erro do juiz são agora possíveis. A justiça será
restabelecida na sua integridade por aquele que, tendo estabelecido a lei, tem
o direito de exigir contas daqueles a quem elevou à dignidade de agentes
morais, autores e pais de seus atos (169, 213).

c) A Moral exige Deus. É
a conclusão que ressalta do estudo da sanção que mostra de novo que não existe
Moral sem Deus, assim como não existe Moral sem idéia de bem e de mal.

277      4.    Valor da sanção.

a)         Objeção estóica e kantiana. Os estóicos, na antigüidade, e Kant, entre os modernos, admitiram que a idéia de sanção
arruinaria a Moral, tornando a prática do bem interessada,
enquanto que o
bem não deve ser desejado e praticado a não ser por si mesmo, em razão de seu
valor intrínseco.

b)         Discussão. Esta objeção se apóia numa falsa noção de sanção. Ela
supõe que a sanção possa ser, por si mesma e independentemente do bem, a razão
última do ato. Ora, já vimos, ao contrário, que a sanção é una com o bem e o
mal: ela é, enquanto felicidade ou desgraça, o aspecto subjetivo da perfeição
realizada ou da decadência consumada.

Por outro lado, é bastante
legítimo que o sentimento vivo da sanção, quer dizer, sempre sob o aspecto
subjetivo de nosso destino moral, nos ajude e nos encoraje a fazer o bem e
evitar o mal. Sem este sentimento, nossa atividade moral perderia um
auxiliar precioso e mesmo necessário
à procura de um destino em que não
apenas a tendência racional, mas também as aspirações da sensibilidade e do
coração devem encontrar acabamento e perfeição.

§   4.     A VIRTUDE E O VÍCIO

278        1. Noção.
— A virtude é o hábito do bem, quer dizer, uma disposição estável para
agir bem, que afeta a vontade do agente moral. — À virtude se opõe o vício, que
é o hábito do mal, ou uma disposição estável para agir mal.

2.    Classificação.

a) As virtudes cardinais. Podem-se classificar
as virtudes de diferentes pontos-de-vista. Um princípio de classificação  
(adotado por Platão) pode ser
tirado da importância das virtudes. Donde o nome de virtudes cardinais dado
a virtudes consideradas como as primeiras de todas e a fonte das outras: prudência,
coragem, temperança, justiça.

b) Virtudes naturais e
virtudes morais.
Esta divisão repousa no fato de que certas qualidades
morais dadas pela natureza podem pertencer tanto aos desonestos quanto às
pessoas honestas e direitas (por exemplo, a coragem, a prudência, as virtudes
cívicas), — enquanto que as virtudes propriamente morais são aquelas que resultam
de uma escolha racional e de um esforço de perfeição moral e supõem um mérito
moral.
Deste ponto-de-vista, todas as virtudes, cardinais e naturais, podem
ser moralizadas, quer dizer, praticadas por fins propriamente morais. Assim,
a temperança (que pode ser uma virtude natural) será moralizada pela intenção
de se conduzir como um homem que domina as exigências desordenadas dos sentidos.

3. Origem das virtudes e dos
vícios. — As virtudes e os vícios são inatos ou adquiridos? São uma coisa e
outra ao mesmo tempo:

a)         Inatos, enquanto encontramos em nós os germes mais ou
menos fortes de todos os vícios e de todas as virtudes.

b)         Adquiridas, no sentido de que não é mais do que por nossos esforços que os germes das virtudes crescem virtudes sólidas e duráveis, — e por
nossa lassidão que os germes dos vícios se desenvolvem e adquirem
raízes profundas.

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