AS CAUSAS – Curso de Filosofia de Jolivet

Curso de Filosofia – Régis Jolivet

Capítulo Terceiro

AS  CAUSAS

Art. I.    NOÇÕES GERAIS

196 1. Definições. —
Chama-se princípio aquilo de que uma coisa procede, de qualquer maneira que
seja. Assim, toda causa é princípio, mas todo princípio não é causa, pois o
termo causa só se emprega para designar aquilo de que uma coisa
depende quanto a existência.
Chama-se efeito o produto da ação
causai e conseqüente o que resulta do princípio,

2.      
Análise da causa. — A análise
revela três elementos ou condições na noção de causa. Por um lado, a causa
deve ser realmente distinta do efeito.
Em seguida, a causalidade não se
confunde com a atividade: agir não é necessariamente causar ou produzir. —
Por outro lado, o efeito deve depender realmente da causa, pois é em
virtude da causa que é produzido. — Enfim, a causa deve ter sabre o efeito
uma prioridade de natureza.
Dizemos: "uma prioridade de natureza", e não uma prioridade de tempo, pois a causalidade ê uma relação que
não implica necessariamente o tempo (ou a sucessão). É mesmo necessário dizer
que, considerados no que têm de essencial, o exercício da ação causai e a
produção do efeito são coisas simultâneas e indivisíveis.

3.      
Causa, condição, ocasião. — É
necessário distinguir cuidadosamente estas três noções. A condição é o que
permite à causa, produzir seu efeito,
seja positivamente a título de
instrumento ou de meio (assim, o arco é para o violinista a condição da melodia
que vai tocar), — seja negativamente, afastando os obstáculos (assim, o
pianista deve fazer afinar seu piano, se quer tocar direito).

AS CAUSAS

A ocasião é uma
circunstância acidental,
que cria
condições favoráveis à ação (assim, o bom tempo é a ocasião que me decide a
fazer um passeio). Nem a condição mais favorável, nem a condição mais
indispensável (chamada condição sine qua non) podem ser confundidas com
a causa propriamente dita, pois o efeito não depende dela essencialmente, mas
acidentalmente.

ART. II.    AS QUATRO ESPÉCIES DE CAUSAS

196 bis Distinguem-se
quatro tipos de causas: eficiente, material, formal e final. Tais são então as
quatro maneiras pelas quais o ser pode contribuir para produzir alguma coisa.

§   1.      A   CAUSA EFICIENTE

1.      
Definição. — A causa eficiente é
aquela que, por sua ação-física, produz o efeito. O escultor é causa da
estátua, como estátua.

2.      
Divisão. — A causa eficiente pode
ser, quer causa principal ou instrumental, — quer causa essencial ou
acidental, — quer causa primeira ou segunda, — quer (num sentido lato) causa física
ou moral.

a) Causa ‘principal
e causa instrumental.
A causa eficiente é causa principal, quando age
por sua própria virtude
(o escultor, que trabalha o mármore; o arquiteto,
que constrói a casa) ; — ou causa instrumental, quando esteja ao
serviço da principal
(o cinzel do escultor; o pedreiro que executa os
planos do arquiteto).

A ação é comum à causa principal e à causa instrumental, mas
sob aspectos diferentes. Ela é inteiramente, mas não totalmente, efeito da
causa instrumental
(a casa é inteiramente produto da atividade dos
pedreiros, marceneiros, carpinteiros etc.; mas não o é totalmente, uma vez que
o plano da casa não é obra sua). — Ao contrário, a ação é inteiramente e
totalmente efeito da causa principal,
enquanto que esta determina e dirige
toda a atividade da causa instrumental.

Daí se segue que o efeito
se assemelha à causa principal e não à causa instrumental: 
o  estilo da
casa revela o arquiteto  e não o pedreiro. — Pode também deixar a marca do
instrumento, na medida em que este exerceu sua atividade própria juntamente com
a ação da causa principal (quer dizer, foi ele próprio numa parte da obra causa
principal) : assim, pode-se reconhecer, numa construção,  a maneira própria de
tal pedreiro.

b)          Cansa essencial e causa
acidental.
A causa, seja principal,
seja instrumental, pode ser causa por si (ou essencial) ou causa por
acidente
(ou acidental). A primeira é a que produz o efeito próprio
a que está ordenada; assim acontece com a operação cirúrgica que cura o
doente. —A segunda é a que produz um efeito a que não está ordenada: assim, a operação
cirúrgica que provoca a morte do paciente; assim, ainda, o ato do cultivador
que, cavando seu campo para plantar uma árvore, descobre um tesouro.’ Vê-se
assim que o efeito da causa acidental, ao contrário do da causa essencial,
não tem razão final,
uma vez que se produz fora das intenções do agente. É
por excelência o que se passa com o acaso, que é então propriamente uma
causa acidental.

c)          Causa primeira e causa segunda. A causa principal pode ser causa
primeira ou causa segunda, conforme seja principio primeiro ou princípio
intermediário da ação.
Por isto mesmo, toda causa principal é primeira sob
algum aspecto, e toda causa primeira é necessariamente causa principal.

Da mesma forma, toda causa segunda é
instrumental em relação à causa primeira de que depende. Mas pode sob uma
outra relação
ser por sua vez causa principal, da mesma forma que a
causa primeira pode não ser primeira a não ser sob uma relação definida e causa
segunda sob uma outra relação.
Veremos que apenas Deus é causa absolutamente
primeira e independente: todas as outras causas agem apenas na dependência de
Deus, Causa primeira universal, e, como tais, não são mais do que causas
segundas.

d)     Causa física
e causa moral.
Chama-se causa física aquela que age por um influxo
físico.
Por "influxo físico", todavia, é necessário não entender
uma atividade de ordem sensível e material, mas apenas um influxo real: assim,
o arquiteto é a causa física da casa, enquanto dirige toda a atividade dos
operários.

A causa moral é a que
consiste apenas em determinar moralmente um agente racional no
exercício de sua atividade própria, assim, os conselhos dados a um amigo para
encorajá-lo, numa empresa. A causa moral, assim entendida, apenas
impropriamente é chamada causa eficiente
e antes exprime a causalidade
final.

197 3. Ação e paixão.
– Podemos, agora, tentar penetrar ainda mais na noção da causalidade eficiente,
estudando as relações da ação e da paixão ou, o que vem a ser o mesmo, do
agente e do paciente.

a)    A causa não
muda pelo fato da ação.
Com efeito, a causalidade, como tal, não
exprime mais do que o ato de produzir alguma coisa, o que, de si não
implica nenhuma passividade no agente.

Este princípio, todavia, não
exclui a transformação acidental no agente. É certo, realmente, que o
agente corporal é sempre modificado, no próprio exercício de sua
atividade causai, pela reação do sujeito sobre o qual age (ou paciente)
:
assim, o martelo se aquece batendo. Mas o agente não é modificado enquanto
age; apenas enquanto sofre por sua vez uma ação de retorno
(ou reação) da
parte do paciente. Por isso, uma causa eficiente que fosse unicamente causa,
sem nada receber (ou sofrer) de nenhuma causa, permaneceria sempre
absolutamente idêntica a si mesma. É o que ocorre com Deus, causa primeira
universal.

b)         A ação está no paciente. O termo ação é tomado aqui no sentido de efeito
produzido.
Como tal, a ação não está na causa a não ser como no seu
princípio; seu termo está no paciente, que recebe uma modificação e não está
nada fora do paciente. A ação constitui então, com a paixão, uma única e
mesma realidade,
que exprime, enquanto ação, uma relação do agente ao
paciente, e, como paixão, uma relação do paciente ao agente.

c)         O efeito preexiste na causa. Este axioma significa, não apenas que o efeito
preexiste virtualmente na causa, mas ainda que ele preexiste de uma
maneira mais perfeita
nela do que existe em si mesmo, enquanto produzido e
realizado.

De um lado, se a causa não possuísse virtualmente
toda a per feição do efeito, este viria do nada,
ou o mais viria do menos,
o que é absurdo. — De outro lado o efeito, antes de ser produzido, nada
mais é do que a causa enquanto potência de produzi-lo, e, realizado, não é
senão um aspecto parcial da perfeição da causa, o que equivale a dizer que a
causa necessariamente mais perfeita do que o efeito.

§ 2.   Causa
material e causa formal

197bis 1. A causa material. — Designa-se por este nome a matéria de que uma coisa é feita, quer
dizer, sob uma forma mais técnica, o que concorre para a constituição de um
composto como parte intrínseca determinada.
Com efeito, num composto, a
matéria é o princípio determinável (ou potencial), enquanto que a forma é o
princípio determinante (ou ato)   (77).

1. A causa formal. — Vê-se pelo que precede que causa
formal
é sinônimo de forma, uma vez que a forma é o que concorre para a
constituição de um composto como parte intrínseca} determinante e
especificadora 
(79). É assim que a alma humana, se acrescendo ao corpo,
faz dele um ser humano.

 

§ 3.     A CAUSA FINAL

1.    Noção.

a)         Definição. O fim, em geral, é aquilo por que o efeito ê
produzido. É,
então, o termo da ação, na ordem da execução,
e o princípio da ação, na ordem da intenção, uma vez que dirige
toda a série das operações. Sob este aspecto, ela é então causa das causas. Por exemplo: Pedro quer ser engenheiro: é este fim (intenção) que vai
levá-lo a fazer tais estudos, a entrar em tal escola, a realizar tais exames.
Quando conquistar o título de engenheiro, o fim (ou intenção) será realizado e
toda a série de atividades dirigidas por este fim estará ao mesmo tempo terminada. O fim é, então, ao mesmo tempo, o princípio e o termo da ação.

b)         Natureza da causalidade final. Como explicar a causalidade final, quer dizer, sua
propriedade de mover o agente a produzir alguma coisa? É evidentemente o
desejo que está no princípio do movimento:
é porque fui solicitado por
alguma coisa, que me apareceu como desejável, que resolvi agir.

Mas a explicação deve
ser procurada mais adiante, porque pode-se ainda perguntar a razão do
desejo. Ora,
nós sabemos (192 bis) que a tendência e o desejo não são
postos em ato senão pela apreensão de algum objeto que se apresente sob o
aspecto de um bem que convém ao agente. É, então, fundamentalmente, o bem
enquanto desejável, que explica a causalidade final.
Eis por que se afirma
que o fim e o bem são convertíveis.

2. Divisão. — Pode-se
distinguir o fim em fim da obra e fina do agente, — em fim principal e fim
secundário, — em fim imediato e fim derradeiro.

a)         Fim da obra e fim do agente. O
fim da obra é objetivo:
é o fim ao
qual a obra está ordenada por sua própria natureza: assim, a esmola é, por si,
destinada a amenizar a miséria do pobre. — O fim do agente ê subjetivo, pois
reside na intenção: aquele que dá a esmola pode visar quer a amenizar a
miséria, quer a obter uma reputação lisonjeira de generosidade. Quando o fim do
agente não coincide com o fim da obra, esta se torna um simples meio.

b)        Fim principal e fim
secundário. O fim principal é aquele que é visado primeiramente antes de
qualquer outro
e ao qual os outros
fins (chamados secundários) estão subordinados. Assim, o soldado combate com
coragem para defender sua pátria e, secundariamente, para obter uma
condecoração e uma promoção.

c)         Fim mediato e fim derradeiro. Quer sejam principais ou secundários, os fins
particulares não são jamais senão fins mediatos,
e jamais o fim derradeiro
da ação. Eles são, portanto, subordinados necessariamente a um fim, que é derradeiro
e absoluto.
Este fim é sempre o bem ou a própria perfeição do agente. Todos
os outros fins são particulares e instrumentais relativamente a este fim
derradeiro.

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